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sábado, 13 de junho de 2020

MANIPULAÇÃO E OCULTAÇÃO

Por ipuemfoco   Postado  sábado, junho 13, 2020   Sem Comentários


Como se não bastassem os exemplos diários de desprezo pela vida e desrespeito à ciência, o presidente Jair Bolsonaro consegue agravar ainda mais a emergência na saúde. Agora, tenta implantar a censura aos números de infectados e óbitos. 

O apagão estatístico revela uma nova estratégia: usar a mentira e a manipulação como métodos para falsear a realidade e reforçar seu poder, enfraquecendo o controle da sociedade. Não é uma iniciativa para salvar a sua popularidade. É um método de dominação por meio da negação da verdade, que afugenta investidores e compromete o futuro do País.

Os militares que povoam a pasta da Saúde, comandada interinamente pelo general Eduardo Pazuello, pressionaram os técnicos a maquiar os números da pandemia. A pressão também chegou à Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que produz relatórios para o governo. 

A desinformação começou na apresentação cada vez mais tardia dos dados, de forma a evitar o uso durante os telejornais noturnos — “acabou matéria no Jornal Nacional”, disse o presidente. E se agravaou na sexta-feira, 5, quando o governo passou a alterar a forma de apresentação dos números. 

Foi uma ordem do presidente, que determinou que a cifra não deveria exceder os 1.000 óbitos diários — esse montante se aproximava de 1,5 mil. O Brasil já superou a marca de 40 mil mortes e 775 mil casos confirmados, e assumiu a liderança mundial em número de fatalidades diárias, superando EUA e Reino Unido. 

O novo método usou uma sugestão feita pelo empresário Luciano Hang, um bolsonarista investigado pela Polícia Federal no inquérito das Fake News.

A maquiagem consistia em registrar apenas as mortes do período, eliminando os óbitos que estavam pendentes de checagem. Além de impedir o acompanhamento da evolução diária da doença, o truque contábil contraria a norma adotada em praticamente todos os países. 

Os números acumulados de contágios e mortes, assim como as taxas de infecção e letalidade pela média populacional, também sumiram do boletim oficial. No domingo, 7, usando os novos critérios, o Ministério da Saúde conseguiu reduzir o número de óbitos em 24h de 1.382 para 525.

Essa pedalada na saúde pública chocou os especialistas e foi denunciada na imprensa mundial. Lembrou um dos períodos mais sombrios do governo Emílio Garrastazu Médici, em 1974, quando a ditadura militar censurou as informações sobre uma epidemia de meningite. Como reação, os principais jornais e sites noticiosos brasileiros formaram um consórcio para compilar dados das secretarias estaduais e divulgar dados confiáveis diariamente. 

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) criou um painel próprio que agrega as estatísticas regionais. O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com uma ação no STF pela divulgação completa dos dados. A Organização Mundial da Saúde (OMS) fez um apelo para que o governo mantivesse a transparência, esperando que a “confusão” nos números fosse solucionada. 

A população precisa de informação para poder se proteger, ressaltou a entidade. O alarme com as adulterações soou mais forte quando o empresário Carlos Wizard, indicado à secretaria de Ciência e Tecnologia do Ministério da Saúde, disse que o governo promoveria uma recontagem dos mortos, pois havia suspeitas de que os dados enviados pelos estados eram “fantasiosos ou manipulados”. Segundo ele, o número de mortos estaria inflado. 

A declaração gerou críticas generalizadas. O Conass a classificou como uma “tentativa autoritária, insensível, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela Covid-19”. Wizard, que havia se notabilizado na ajuda aos refugiados venezuelanos em Roraima, desistiu da indicação e pediu desculpas, mas o ex-ministro do TSE Admar Gonzaga, que advoga para Bolsonaro, reforçou as acusações.

Congresso confronta general

A reação chegou ao Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, cobrou de Pazuello a volta das informações diárias. “Queremos é que todos os brasileiros tenham transparência na divulgação. O que ocorreu nos últimos dias foi exatamente o contrário — pelo menos do ponto de vista da relação de diálogo do governo com o Parlamento e com a sociedade”, criticou. “É uma tragédia o que a gente está vendo, de desmanche da informação”, denunciou o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta. 

“Me parece que o que estão querendo fazer é uma grande cirurgia nos números dos protocolos públicos. Não informar significa o Estado ser mais nocivo que a doença, mais nocivo do que o vírus”, disse o ex-titular da Saúde. 

Contra todas as evidências, Pazuello argumentou que a forma de divulgação anterior “era simplória”, “não dizia nada” e era feita com base na soma de “coisas que não eram somáveis”. Defendeu que as informações passaram a ser “plenas”, “transparentes” e disponibilizadas em “tempo real”. 

A ação nefasta só foi revertida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele determinou na segunda-feira, 8, que o governo retomasse a divulgação dos dados como ocorria até o dia 4 de junho.

Desde abril, quando Mandetta ainda dirigia a pasta da Saúde, o presidente planejava mexer na comunicação diária. Queria substituir os dados de óbitos pelo “placar da vida”, o número de curados — uma visão “poliana” da crise que não convenceu nem os próprios bolsonaristas. Para colocar em marcha essa impostura, afastou Mandetta. 

Com isso, revelou mais uma vez seu conceito distorcido da comunicação. Considera que o papel da imprensa é fazer propaganda do governo, não fiscalizá-lo. Além disso, quer transformar a inação e negligência pessoal em um triunfo aparente. Essa fábrica de falsidades e desinformação ganhou nova dimensão, mas não é nova. Desde o início de seu mandato, o presidente investiu contra a transparência. No primeiro mês de mandato, tentou ampliar a classificação de documentos como secretos. 

Durante a pandemia, quis passar uma lei desobrigando os órgãos públicos de cumpriram prazos de liberação de dados via Lei de Acesso à Informação. O véu de opacidade vai desde os seus exames de Covid-19, que só foram liberados após uma ação no STF, até os dados de gastos de cartões corporativos da Presidência, que explodiram na atual gestão. No IBGE, as pesquisas sobre desemprego se tornaram alvo de ataques.

O falseamento de informações também atinge a comunicação oficial. Ao aprovar com ressalvas as contas do governo Bolsonaro em 2019, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas apontou a falta de transparência dos gastos com propaganda e publicidade. Segundo ele, os dados “indicam algum risco de que os recursos públicos possam estar sendo utilizados para manipular as demais informações que circulam pela sociedade, em especial a veiculada pela imprensa”. 

Em seu parecer, Dantas apontou o risco envolvido e “as implicações para o legítimo funcionamento das instituições públicas e, em última instância, da própria democracia”. O alerta também vale para o Orçamento. Em 2019, houve transferência de despesas de ministérios para estatais, uma forma de contornar a regra do teto de gastos.

Ao ser confrontado com a manipulação na saúde, Bolsonaro atacou a imprensa. “O que nós não queremos é números mentirosos, que servem para inflacionar e para manchetes de jornais. Estão usando o governo federal como se a responsabilidade fosse exclusivamente minha. Esses números aí tem de servir para alguma coisa, e não para dar manchete para jornal”, disse

Em seguida, mais uma vez usou dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de forma equivocada e maliciosa. Pinçou uma afirmação sobre a baixa probabilidade de contágio dos infectados não sintomáticos como argumento para combater o isolamento social — única forma comprovada de deter a doença. Ao falsificar dados, Bolsonaro impede que o País tenha uma resposta eficiente aos seus problemas. Foi assim que a Argentina agravou sua situação econômica, depois que o peronismo passou a esconder os índices de inflação.

GUERRA E INFORMAÇÃO Em reunião de ministros, o governo trata o combate à Covid-19 apenas como uma arena de operações militares. As entrevistas coletivas diárias foram esvaziadas com atrasos sucessivos, falta de informações e dados manipulados (Crédito:Marcos Corrêa/PR)

Também coloca o Brasil ao lado de ditaduras como a Coreia do Norte e a Venezuela, que sonegam informações e forjam uma realidade paralela. O próprio filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, um aprendiz de autocrata, usou o exemplo da tragédia de Chernobyl, na extinta União Soviética, para acusar a ditadura chinesa de omitir informações da pandemia, criando um incidente com nosso principal parceiro comercial. 

Dois meses depois, o pai fez pior. Como contraexemplo, a Suprema Corte renovou a tradição democrática centenária dos EUA nos anos 1970 ao deliberar pela publicidade de documentos da Guerra do Vietnã, que mostravam o falseamento em sucessivos governos. 

“Manipulação de estatísticas é manobra de regimes totalitários”, disse o ministro Gilmar Mendes, do STF. Ele ainda ressaltou que as mudanças nos registros oficiais não vão “isentar responsabilidade pelo eventual genocídio”. 

A ameaça ao mandatário não vale apenas para o território brasileiro. No mesmo dia em que o STF determinava a volta da transparência nos dados da pandemia, o Tribunal Penal Internacional (TPI), na cidade de Haia (Holanda), informou que vai analisar uma denúncia responsabilizando Bolsonaro por crime contra a humanidade. 

O presidente foi acusado pelo PDT por sua postura no combate à Covid-19. O partido diz que o mandatário tem contrariado recomendações para reduzir a velocidade do contágio e, desse modo, colabora para o colapso do sistema de saúde.Também lista uma série de episódios em que Bolsonaro ignorou recomendações da OMS e do próprio Ministério da Saúde, como o comparecimento a manifestações.


Militares apoiam manobras

Enquanto o presidente luta para ocultar a realidade, faltam ações para solucionar problemas. O governo está à deriva. Para usar uma metáfora militar, tão ao gosto do mandatário, nossas forças estão levando uma surra do inimigo, por incompetência e desinformação — e sendo desmoralizadas. É o oposto da imagem que as Forças Armadas gostariam de cultivar. 

Os militares de Bolsonaro apoiam ataques às instituições democráticas e manobras diversionistas contra a saúde. Mesmo sem formação na área, mais de 20 ocupam a cúpula da pasta da Saúde, que está sem titular — apesar de já ter tido dois ministros durante a pandemia. Na guerra contra o vírus, os comandantes deveriam reunir os melhores cérebros e talentos — e não desmoralizá-los e escorraçá-los, negando os esforços científicos. 

Poderiam, por exemplo, ter centralizado as compras de equipamentos, dando mais eficiência ao esforço nacional. Mas fizeram o contrário. Não só deixaram de entregar os respiradores que prometeram, como lançaram suspeitas generalizadas sobre todos os gestores, além de sabotar a luta pelo isolamento social que salva vidas.

Na moderna guerra tecnológica, a informação é vital. Ao militarizar o governo, o presidente não está profissionalizando a gestão. O Chávez brasileiro se escora nos piores exemplos e desmoraliza as Forças Armadas. Recicla práticas corruptas e decadentes da caserna de outros tempos, como na França do século XIX. 

No famoso episódio do capitão Dreyfus, o exército gaulês vivia uma cultura de mentiras, era manietado por grupos secretos, cercava-se de preconceito e castas privilegiadas. É com essa decadência que as Forças Armadas brasileiras flertam ao apoiar as investidas do presidente. Elas se divorciam da sociedade — o general Pazuello não deveria ter aceito a manipulação. 

Na França, o ardil só foi desmascarado pela coragem da imprensa e de intelectuais que denunciaram uma trama sórdida contra o capitão. Exposto, o exército gaulês não recuperou sua glória passada, mas a sociedade francesa se fortaleceu. 

O episódio mudou o curso do debate moral e ético no país europeu e até hoje serve de guia para a conduta dos governantes. No Brasil, a sociedade já começa a se levantar contra um esbirro de ditador que fabrica falsidades, promove a morte e atenta contra a democracia.

ENFIM, UMA NOTÍCIA POSITIVA NA COMUNICAÇÃO

Em meio à crise de imagem, o governo Bolsonaro anunciou a recriação do Ministério das Comunicações e decidiu nomear Fábio Faria como ministro. Deputado federal do PSD do Rio Grande do Norte, Faria é genro de Silvio Santos, dono do SBT. 

A nova estrutura de comunicação visa melhorar a relação com a imprensa. Por isso, a nova pasta vai incorporar a estrutura da Secretaria de Comunicação Social (Secom), que será extinta. 

O chefe da Secom, Fábio Wajngarten, passa a ser secretário-executivo do Ministério. Também vai incorporar a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que controla a TV Brasil. Nesse caso, segundo Bolsonaro, o intuito é tirar a TV Brasil do “traço” e, em seguida, privatizá-la.

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