A VOLTA DE JOSÉ DIRCEU

 

Depois de vários anos na cadeia e longe dos bastidores da política, o ex-ministro volta à articulação petista e já tenta convencer senadores do partido a aprovarem o nome de André Mendonça para o STF: a Lula e a Bolsonaro interessa o fim da Lava Jato

No momento em que Lula tenta pavimentar seu retorno à vida política, com vistas a 2022, um influente petista ressurge das cinzas para assombrá-lo, após ficar vários anos afastado, às voltas com a Justiça. Ex-todo poderoso ministro do governo do PT, José Dirceu já está reassumindo o papel de eminência parda na campanha lulista. 

Depois de ter sido preso três vezes e ainda ser alvo de dois processos da Operação Lava Jato por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, Dirceu mudou-se para a casa da sogra, em Brasília, há alguns meses, o que lhe permite estar mais próximo dos bastidores da política. 

Ele tem escrito artigos, preparado palestras e tentado recuperar o direito de advogar — pois foi cassado em 2015 devido à condenação no processo do mensalão. Fora isso, também usa seu tempo para organizar uma série de encontros com políticos e líderes sindicais.

No retorno aos bastidores da política, Dirceu estaria tentando convencer senadores do PT a apoiarem o nome de André Mendonça, indicado pelo presidente para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Quatro pessoas próximas a Dirceu relataram que o ex-ministro tem atuado para reverter as intenções de votos de vários senadores petistas que tenderiam a votar contra o nome do ex-Advogado-Geral da União (AGU) de Bolsonaro.

Afinal, Dirceu sabe que Mendonça é claramente contrário à Lava Jato e enterrar de vez a operação é uma missão que une tanto petistas quanto bolsonaristas. Dos seis senadores petistas, pelo menos quatro deles são investigados por corrupção pela força-tarefa. Além do próprio ex-ministro, que ainda responde a ações conduzidas pelo Ministério Público Federal do Paraná, o próprio Lula já foi preso em decorrência dos processos lavajatistas e ainda pode tornar-se inelegível por conta dessas ações. 

Por iniciativa de Dirceu, Mendonça tem jantado com vários senadores petistas, como é o caso do senador Jean Paul Prates (PT-RN), para garantir a vitória do bolsonarista no Senado.

Internamente, o retorno de Dirceu às articulações políticas é visto com bons olhos pelos dirigentes petistas, embora ainda sofra resistências da ala ligada à presidente da legenda, a deputada Gleisi Hoffmann. Ele é visto como uma espécie de conselheiro de dirigentes partidários e o plano é que ele atue nas costuras de alianças em torno da candidatura de Lula, mas longe dos holofotes, para evitar o desgaste em função do fato de ainda estar sob ameaça de voltar para a cadeia. “A gente percebe que ele tem participado mais das reuniões do PT”, contou um parlamentar da legenda.

Sem jatinhos e sem mansão

A expectativa é que ele participe de amarrações com os aliados em áreas estratégicas, como São Paulo — o maior colégio eleitoral do País —, Rio de Janeiro e Nordeste, onde o PT negocia acordos com o PSB. No Rio, o partido deve apoiar o deputado Marcelo Freixo (PSB) para o governo fluminense, enquanto no Nordeste os petistas tentam se aproximar dos socialistas para aumentar o poder de fogo junto à centro-esquerda, já que sofre a concorrência de Ciro Gomes (PDT) na região. 

Na semana passada, Dirceu viajou à região Norte para tratar das alianças regionais e, em razão da viagem, precisou desmarcar uma reunião que teria com o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, para dar início às tratativas que unam o movimento sindical em torno do PT. Ambos já haviam se encontrado em julho numa visita em que o ex-ministro fez a algumas lideranças sindicais em São Paulo. Para Juruna, a atuação de Dirceu tem sido fundamental para reaproximar Lula das suas bases. 

A relação estava estremecida desde o governo de Dilma, quando um grupo de sindicalistas rompeu com a petista. “As conversas têm sido muito positivas. Dirceu tem ajudado a tranquilizar os ânimos dentro da Força, contribuído para a reaproximação com Lula”, disse Juruna à ISTOÉ, para quem a esquerda deveria se aproximar também dos partidos de centro-direita.

Recuperar o bom relacionamento com os sindicalistas pode também ajudar o PT a atrair partidos como o Solidariedade, presidido pelo deputado Paulinho da Força (SP), e Dirceu é fundamental nesse processo. Os dois estiveram juntos há 20 dias na casa da sogra do ex-ministro. 

“Nos encontramos em Brasília. Nunca deixei de falar com o Zé, que é meu amigo”, afirmou Paulinho. O petista já se reuniu também com o ex-presidente José Sarney (MDB-MA), com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, com parlamentares petistas e principalmente com o prefeito de Diadema, José de Filippi Júnior (PT), que tem grande influência no ABC paulista, o berço político do partido.

Atualmente, Dirceu não leva mais a vida luxuosa de antes, como o uso de jatinhos e o desfrute de uma mansão em Vinhedo, no interior de São Paulo. Após várias derrotas nos tribunais, o ex-ministro teve bens bloqueados e uma casa no bairro da Saúde, em São Paulo, chegou a ser leiloada pela Justiça para ressarcimento dos cofres da Petrobras. Ele foi obrigado também a encerrar a carreira de consultor por conta das condenações. 

Sua única fonte de renda hoje é a aposentadoria de R$ 9,6 mil que recebe da Câmara por ter sido deputado federal por três mandatos. Condenado a 40 anos de prisão, o petista responde a dois processos no STJ em liberdade e já não estaria mais usando tornozeleira eletrônica, artigo que usou até recentemente. Agora, torce pelo retorno do PT ao poder para reerguer seu patrimônio.ISTOÉ