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domingo, 5 de abril de 2020

ESTÁ NA HORA DE COMEÇARMOS A FALAR SOBRE MOURÃO

Por ipuemfoco   Postado  domingo, abril 05, 2020   Sem Comentários


Jair Bolsonaro continua resistindo a combater a epidemia do coronavírus, na contramão do mundo. Mais que isso, aproveita para radicalizar seu discurso contra os outros Poderes. 

Está cada vez mais isolado e perde as condições políticas de liderar o País. Com isso, cresce a percepção de que é necessária uma alternativa para driblar a paralisia e recolocar o País nos trilhos após a crise — que é ao mesmo tempo econômica, sanitária, institucional e social. 

Ao se colocar como um obstáculo para a condução do País, a alternativa constitucional que se impõe é a ascensão do vice Hamilton Mourão. De uma mera hipótese, a tese do afastamento já é tratada em Brasília como uma possibilidade concreta.

O isolamento do presidente atingiu seu ápice no início da última semana, depois que foi confrontado pelo núcleo militar do Palácio do Planalto e pelos principais ministros — Sergio Moro (Justiça), Paulo Guedes (Economia) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde). Todos são a favor do isolamento social, um consenso internacional. 

O titular da Saúde se recusou a voltar atrás nas suas recomendações técnicas, mesmo confrontado pelo mandatário. No sábado, 28, disse que o presidente precisaria demiti-lo se quisesse mudar a orientação do ministério. Bolsonaro recuou. Na terça-feira, 31, em seu quarto pronunciamento na TV sobre a pandemia, falou em um tom mais conciliador. 

Mas, como havia feito antes, voltou a distorcer a mensagem do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, que citou o risco que as medidas de isolamento trariam para os mais pobres. Ao contrário do que o presidente insinuou, a menção pregava a assistência financeira, e não o fim das medidas de isolamento. O pronunciamento gerou uma nova onda de panelaços pelo país. 

O novo tom durou pouco. Na manhã seguinte, divulgou no Twitter um novo ataque aos governadores, com uma notícia falsa sobre desabastecimento na Ceasa de Belo Horizonte.


Em pronunciamento na terça-feira, 31, o presidente Jair Bolsonaro tentou romper o isolamento e recuou em seu ataque ao isolamento social, defendendo um amplo pacto nacional contra a crise

Essa nova mensagem em cadeia nacional foi o resultado de uma semana de crises dentro do Palácio do Planalto. No dia 24, o presidente havia decidido radicalizar seu discurso. Além de temer as consequências da recessão para o seu mandato, queria contra-atacar os governadores que lideravam a mobilização. 

Fez nesse dia um pronunciamento raivoso pregando o fim do confinamento em massa. Pretendia mobilizar os militares, mas o movimento não foi acompanhado, inclusive pelos da ativa. Um dos militares com gabinete no Palácio do Planalto se recusou a endossar o discurso e deixou o Planalto. O general Edson Leal Pujol, comandante do Exército, divulgou horas antes desse pronunciamento um vídeo dizendo que a corporação estava integrada ao esforço contra o coronavírus. 

Disse que essa “talvez seja a missão mais importante de nossa geração”. O tuíte teve enorme visibilidade.

O presidente tem mostrado cada vez mais instabilidade emocional. No início do ano, havia tentado dar mais protagonismo ao núcleo militar do governo, em detrimento do grupo ideológico. Com o agravamento da crise, voltou-se para os filhos. Para tentar recuperar o controle da crise, escalou o general Walter Braga Netto, chefe da Casa Civil. Ele passou a liderar o Comitê de Crise com o objetivo de tirar a visibilidade do ministro da Saúde, mas a manobra deixou ainda mais estampada a fragilidade na condução do processo. 

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo, o secretário de Governo, Luiz Eduardo Ramos, e Braga Netto têm buscado conter o ímpeto do presidente contra as medidas de isolamento, mas sem sucesso. Isso provocou em Brasília reuniões entre militares para discutir os possíveis cenários. Os militares estão apoiando Bolsonaro menos por convicção e mais porque temem a crise institucional. Além disso, consideram que a emergência pode derivar para distúrbios, com a falta de comida e a perda de empregos. 

Os militares também não desejam ser instrumentalizados em uma disputa política do presidente com outros Poderes, ou com os governadores. O medo é que o presidente, acuado, radicalize e seja tentado a gestos autoritários — afinal, já chegou a dizer que não pensava no Estado de Sítio “nesse momento”. “Quem quer dar o golpe jamais vai falar que quer dar”, respondeu em outra ocasião. As Forças Armadas não desejam ser envolvidas em uma aventura. Há a delicadeza também de que a imagem da corporação hoje está associada ao governo. 

Esse é mais fator que leva os militares a tentar conter o isolamento do chefe, apesar de sua atitude errática e cada vez mais agressiva. Por isso, as mensagens emitidas têm sido ambíguas, destacando a preocupação, mas ao mesmo tempo dando suporte ao presidente. 

Na véspera do último pronunciamento, Bolsonaro pediu a ajuda do ex-comandante do Exército, o general Eduardo Villas-Bôas, após uma desastrada visita que fez ao comércio popular em Brasília. O militar, que tem ascendência entre os seus pares, aquiesceu. Divulgou um tuíte em defesa do presidente, alertando que “ações extremadas podem acarretar consequências imprevisíveis”.

Sem o apoio do Congresso

No caso da crise se agravar, é possível que o governo seja informalmente dirigido por um comitê de ministros, ou por meio de uma maior participação dos militares. Isso não seria inédito na história política brasileira. Quando o governo Collor derretia, a condução também passou a ser de um grupo de “notáveis” do ministério. 

Como há a sensação de Bolsonaro já não governa, discutem-se em Brasília alternativas. Uma saída seria a renúncia, mas o presidente não dá nenhum sinal de considerar essa possibilidade. Lideranças no Congresso relutam em colocar o impeachment em marcha, pois temem que o mandatário utilize a iniciativa para posar de vítima dos políticos e do “establishment”. 

Mas a perda de sustentação parece irreversível. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, declarou na última quarta-feira que o governo Bolsonaro não tem mais apoio no Congresso e terá de estabelecer nova relação com o parlamentares após a crise. Nesse momento, o Parlamento está empenhado em buscar soluções para a pandemia, mas, depois, “a situação tende a se complicar para o governo”, afirmou. Outro caminho para o afastamento é a notícia-crime por crimes contra a saúde pública. 

Uma ação nesse sentido foi encaminhada na segunda-feira, 30, pelo ministro do STF, Marco Aurélio Mello, para a Procuradoria-Geral da República, em resposta a um pedido feito pelo deputado Reginaldo Lopes, do PT mineiro. No mesmo dia, sete partidos de esquerda também decidiram ingressar com uma notícia-crime contra o presidente, pedindo o seu enquadramento por incitação à prática de crime. 

Outra possibilidade constitucional é a interdição. Um grupo de advogados solicitou no último dia 21 ao Ministério Público do Distrito Federal que o presidente seja considerado incapaz para os atos da vida civil. Eles pedem que seja feita uma avaliação psiquiátrica de Bolsonaro, pois suas atitudes na crise teriam configurado “um considerável grau de desorientação e confusão psíquica”.

O jurista Miguel Reale Jr., que foi um dos responsáveis pelo pedido de impeachment de Dilma Rousseff, não vê oportunidade nesse momento para o impeachment. Mas acha que já há embasamento técnico, pois está caracterizada a contínua falta de respeito às leis e à dignidade da função. “Ele é o inimigo da saúde pública, não tem limite ético, é amoral.” 

Mas ele considera que não é o momento de politizar, pois um eventual processo de impeachment, além de lento, poderia servir ao próprio presidente. “É o instante da classe política e entidades médicas atuarem na luta pela saúde pública.” Após o pronunciamento de Bolsonaro no dia 24, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso reagiu. 

“O presidente repetiu opiniões desastradas sobre a pandemia. O momento é grave, não cabe politizar, mas opor-se aos infectologistas passa dos limites. Se não calar estará preparando o fim. E é melhor o dele que de todo o povo. Melhor é que se emende e cale”, divulgou no Twitter. Líderes de esquerda — Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL) e Flávio Dino (PCdoB) — pediram a renúncia.

Além do freio de arrumação imposto pelos ministros, o Congresso e o Judiciário já deixaram claro que vão impor limites à atuação de Bolsonaro. O presidente do STF, Dias Toffoli, disse que não dá para combater o coronavírus com “achismos” e defendeu a atuação de Mandetta. 

O ministro Luís Roberto Barroso vetou a campanha “O Brasil não pode parar”, divulgada — e depois suprimida — dos canais oficiais. Gilmar Mendes usou seu Twitter para defender as recomendações da OMS: “A crise não sustenta o luxo da insensatez”. Além de encaminhar a notícia-crime à PGR, o ministro Marco Aurélio Mello decidiu que governadores e prefeitos podem determinar sobre restrições de circulação de transporte.

Foco em Mourão

As atenções em Brasília se voltam para o vice, que tem a simpatia em um amplo espectro político. Formado na Academia Militar das Agulhas Negras, Mourão nunca foi próximo do presidente, apesar de manter uma relação cordial desde os anos 1980. Foi escolhido para ocupar a vaga de vice quando se preparava para concorrer ele mesmo à Presidência, em 2018. 

É conhecido pela franqueza, o que o indispôs com os ex-presidentes Dilma Rousseff e Michel Temer. Para compor a chapa com Bolsonaro, teve o cuidado de garantir que a agenda econômica fosse liberal. No início da gestão, Mourão foi bombardeado pelo gabinete do ódio por demonstrar muita autonomia. Diminuiu o número de entrevistas, mas não deixou de mostrar sua personalidade e demarcar diferença em relação a posições das quais discorda. 

Tem se mantido no fio da navalha para defender Bolsonaro e, ao mesmo tempo, desfazer equívocos e criticar as ações desastradas do governo. Recentemente, desautorizou Eduardo Bolsonaro, quando esse criou um incidente diplomático com a China — ao culpá-la pela disseminação do coronavírus. Mourão afirmou que o filho “03” do presidente não falava em nome do governo: 

“Se o sobrenome dele fosse Eduardo Bananinha, não teria problema nenhum. É só por causa do sobrenome. Não é a opinião do governo”. Da mesma forma, em plena crise do coronavírus, quando o presidente desautorizou o ministro da Saúde, ele foi uma voz dissonante. 

“A orientação do governo é uma só: isolamento e distanciamento entre as pessoas.” Foi o único general de quatro estrelas do Planalto a se contrapor publicamente ao presidente na crise. Isso incomodou Bolsonaro, que revidou publicamente: “Com todo o respeito ao Mourão, mas ele é mais tosco do que eu. Muito mais tosco. Não é porque é gaúcho, não. Alguns falam que eu sou um cara muito cordial perto do Mourão.”

Pragmático

O vice é poliglota e defende uma política externa pragmática. Além de fiador das relações estratégicas com a China, é o responsável pela coordenação do Conselho da Amazônia, que foi criado depois que as queimadas e os ataques de Bolsonaro fragilizaram a relação brasileira com os investidores. 

Em vários temas se diferencia do presidente, como o aborto (acha que é uma opção da mulher) e a transferência da Embaixada em Israel para Jerusalém (é contra). Como militar, tem uma carreira sólida em vários comandos e experiência internacional, como adido militar na Embaixada na Venezuela — o que o tornou um líder natural para formular a política atual em relação ao país. 

Ao contrário de Bolsonaro, sempre defendeu o papel da imprensa. Mantém a posição do Exército sobre o regime militar. No aniversário dos 56 anos do golpe de 64, na última terça-feira, divulgou que a intervenção tinha ocorrido para enfrentar “a desordem, a subversão e a corrupção”, e que o movimento pertencia à história.

“O Mourão é extremamente íntegro, inteligente, educado e trabalhador. É mais bem preparado em vários sentidos do que o Bolsonaro. Administraria muito bem o País”, diz o deputado Alexandre Frota, que já protocolou um pedido de impeachment contra o presidente. 

“É preparado, sabe lidar com conflitos e divergências. É sobretudo um homem de diálogo “, diz a líder do PSL na Câmara, Joice Hasselmann. O senador Major Olímpio, do PSL, diz que “engana-se quem pensa que o Mourão é um troglodita”. Segundo ele, “o centro hoje está confortável porque manda, ignora e afronta Bolsonaro quando quer. 

Só haveria impeachment se fosse uma situação muito flagrante. Mourão é tão boa alternativa que Bolsonaro o escolheu, mas entendo que o melhor para o País será o presidente seguir governando e dar espaço no governo ao Mourão, a começar pela coordenação política”.

No caso de a crise se agravar, é possível que o governo seja informalmente dirigido por um comitê de ministros, ou por meio de uma maior participação dos militares

Apesar de Bolsonaro ter minado boa parte de seu capital político na pandemia, ele ainda mantém o apoio de seu eleitorado mais fiel. Mas está decepcionando muitos setores que se iludiram com ele. É significativo que até o astrólogo Olavo de Carvalho já esteja se distanciando do pupilo. 

O presidente também está sendo abandonado pelo centro, que votou nele para afastar a ameaça da volta do PT ao poder. Internacionalmente, sua imagem não poderia ser pior. Foi descrito pela centenária revista americana “The Atlantic” como o “líder mundial do movimento de negação do coronavírus”. O jornal britânico “The Guardian” disse em editorial que ele “era um perigo contra os brasileiros”. Nunca o País teve um mandatário no papel de pária mundial. 

Está cada vez mais clara a sua incapacidade para liderar o País. Mesmo que nesse momento a melhor saída seja driblar o obstáculo presidencial e lidar com a emergência sanitária, a solução definitiva começa a se impor. Se for afastado, Bolsonaro terá um fim melancólico, processado por crime e indisciplina, como começou a carreira. Será um efeito colateral — benéfico — da Covid-19.ISTOÉ

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