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domingo, 1 de dezembro de 2013

" DE UM DIA PARA OUTRO VIREI ASSASSINO"

Por ipuemfoco   Postado  domingo, dezembro 01, 2013   Sem Comentários


Processado criminalmente por 242 homicídios e pela tentativa de homicídio de centenas de outras pessoas, Elissandro Spohr, o Kiko, um dos proprietários da Boate Kiss, rompeu o silêncio e falou por três horas com Zero Hora no início da noite de quinta-feira - a primeira entrevista a um jornal desde que a tragédia ocorreu.


Em Porto Alegre, no escritório do advogado Jader Marques, Kiko admitiu que tem responsabilidade nos fatos ocorridos em Santa Maria em 27 de janeiro, acusou os órgãos públicos do município e do Estado de não cumprirem com suas obrigações e questionou a perícia que apontou a espuma do palco - colocada por ordem dele - como a causa da maior tragédia do RS e uma das principais do Brasil.

Ao contar que se tornou dono da Kiss quase por acaso, admitiu que desconhecia a capacidade da casa e a obrigação prevista em lei de que funcionários recebessem treinamento de prevenção e combate a incêndio. 

Em sua entrevista, Kiko diz não se surpreender em ter se tornado o inimigo número 1 das famílias das vítimas, que se mobilizam pela sua condenação.

- A Kiss era o Kiko - afirmou o empresário, 30 anos completados na prisão, pai de uma filha de cinco meses.

Os familiares de centenas de vítimas estão organizados para apoiar uns aos outros e formam um bloco consistente em busca de mudança de leis e de procedimentos. A principal expectativa atualmente é de que o Ministério Público revise o inquérito civil de improbidade e inclua no banco dos réus servidores da prefeitura de Santa Maria. 

Dois novos inquéritos estão sendo feitos pela Polícia Civil e podem embasar um novo posicionamento do MP que, ao ingressar com ação de improbidade, excluiu agentes da prefeitura da lista. Confira trechos da conversa com ZH:



Eu confiei nos órgãos públicos, tudo que fiz foi de acordo com o que foi exigido. Se tenho um erro, foi em fazer o que os órgãos públicos exigiram. Se tinha coisas erradas lá, eles tinham que ter me orientado.



Quem vistoriou, Bombeiros, prefeitura e o Ministério Público, que diz que só teve responsabilidade pelo TAC, o que não é verdade. Me solicitaram alvará sanitário, dos Bombeiros, de localização, licença de operação. Tudo o promotor me exigiu.


Em 2009, o MP abriu inquérito civil por causa do barulho. À época, a Kiss funcionava sem documentação, não tinha alvará de localização e de prevenção. Em 2011, o MP firmou um Termo de Ajustamento de Conduta com os atuais sócios, entre eles, Kiko. Foram feitas correções, mas o barulho persistiu. 

Foi então que Kiko mandou instalar a espuma, apontada como principal responsável pelas mortes. Enquanto fazia ajustes para o TAC, o MP detectou problemas de documentação na boate, como licença de operação vencida.



Entrei como sócio em julho de 2010 (comprou a parte de Tiago Mutti e colocou no nome da irmã por ter restrições por conta de outra empresa) e uma das exigências que fiz foi de que tivesse toda a documentação em dia. Em outubro de 2010, comprei a parte do Alexandre (Alexandre Silva da Costa) e passei para minha mãe.



Dos antigos sócios.



Nunca foi sócio. Meu relacionamento com ele é só para dizer que tenho um pai. Se perguntar para ele o nome da minha filha, ele não sabe. Eu sempre quis ser músico, tocar, ele queria que eu fosse empresário, terminasse a faculdade de administração.


O primeiro sócio da Kiss, Alexandre Silva da Costa, disse à polícia que o pai de Kiko era o sócio da boate, apesar de sua parte estar em nome de outra pessoa. Um ex-funcionário também disse que o pai de Kiko era sócio. Outro dos primeiros sócios, Tiago Mutti, declarou que Eliseo Spohr fazia parte da sociedade como investidor. O MP entende que havia indícios que o pai de Kiko era sócio da boate.



Não tem como, nem posso sair de casa.



Toda a documentação estava em dia, alvará dos bombeiros, de localização.



Estavam na parede, tudo regularizado.



O Ministério Público bate muito em obras que foram feitas, que não tinha engenheiro, o que não é verdade. Tenho projeto de engenheiro, de arquiteto, ART. A pressão do MP foi muito grande. Em julho de 2011, recebemos notificação do MP. Era sobre ruídos.



O promotor me informou tudo que tinha, abaixo-assinado, excesso de som. Disse que nós tínhamos que resolver, que o Alexandre (antigo sócio) já tinha feito algumas coisas. O Alexandre apresentou projeto, contratou o mesmo engenheiro que eu contratei depois. Eles acusam que tinha janelas obstruídas, mas isso está no TAC. 

O revestimento fechando as janelas eu não fiz parte, essa primeira espuma das portas, eu não fiz. Eu nem sabia que o Alexandre tinha ido ao MP. Tinha barras de ferro desde a inauguração.



Teve. Guarda-corpo existia em todo o cercado da boate, nas áreas VIPs já tinha. O que eu fiz foi colocar guarda-corpo para organizar a fila.



Mas melhorava a circulação. Criava uma fila organizada.



Mas eu nunca poderia imaginar que ia pegar fogo. Fui no fórum esses dias. Grita fogo lá. Também tem (guarda-corpo). Acham que não vai esbarrar? Como uma mesa vai atrapalhar, um bar, as cadeiras. Qualquer coisa atrapalha em situação de emergência. Não era só a Kiss que tinha isso. Eu coloquei para organizar a fila. Nunca imaginei fogo, nossa preocupação era uma briga. Ninguém entra num lugar pensando que vai pegar fogo.



A única obra feita foi a do TAC.



Tudo no TAC, com engenheiro, com ART. Tem projeto de engenheiro.



Não, as barras não.

"Quem sabe que tem algum tóxico na espuma?"




Foi com orientação profissional.


O engenheiro Miguel Pedroso disse à polícia que, ao ser contratado, em 2011, já havia espuma na parede da boate. Disse que alertou Kiko sobre a espuma não ter resultado para isolamento acústico. 

Depois das obras do TAC, como o problema persistia, Kiko teria dito que colocaria a espuma no palco, e Pedroso teria alertado sobre o material inadequado. O engenheiro Samir (Samara) declarou em depoimento que o projeto de isolamento acústico envolvia gesso e lã de vidro, e que a lã resiste a 30 minutos de fogo.



Não consta. Quando entrei na sociedade, vizinhos reclamavam do barulho, antes de o promotor me chamar. Liguei para o Alexandre e para o Mutti. O Mutti, que é engenheiro, me disse que o Samir (engenheiro Samir Samara) tinha feito a primeira acústica da boate. 

O Samir me disse para colocar uma espuma no palco - a vizinha que reclamava era de lado com o palco - , disse que já tinha avisado o Alexandre que era preciso colocar espuma. Eu comprei do Samir a espuma, a primeira espuma, em novembro de 2010. Foi revestido o palco e o lado da parede que dava na vizinha.



Sim. E o MP esteve lá fazendo fotos antes de eu começar as obras do TAC, e já tinha espuma, já tinha barras. Eu elevei o piso porque tinha um degrau que as pessoas caiam, abri uma porta lateral para fumantes, por minha conta.



O Samir me fez orçamento de R$ 64 mil para as obras do TAC. O Samir contratou o Pedroso (engenheiro Miguel Pedroso). No fim das contas, gastei R$ 250 mil com os dois e com os materiais da obra.



Era quatro metros por cinco metros de espuma, custou R$ 360



Depois que eu fiz tudo isso, obra com projeto, continuou tendo reclamação dos vizinhos. O Pedroso foi lá e disse que teria que fazer nova parede de concreto atrás do palco, e eu fiz.



Não. O que estava no projeto era uma de madeira que não resolveu o problema. Fui na vizinha e propus de trocar a janela dela, colocar uma com vidro duplo, fazer parede de gesso duplo e ainda dei a pintura. O problema foi resolvido parcialmente. Fizemos a parede de concreto (na boate) e o barulho seguia. Chamei o Samir. Ele disse que eu ia ter que colocar espuma em todo teto e na parede.



Quem sabe que tem algum tóxico na espuma?



Não. E o outro engenheiro, o Pedroso, disse que a espuma ia me resolver só 20%. Sugeriu fazer um revestimento no palco com lã de rocha. Não adiantou.



Entrei na internet, procurei por isolamento acústico e apareceu a espuma que eu comprei.



Foi o Ricardo Pasche (cunhado) a mando meu. Foi instalado por funcionários, paguei um extra.



Sim, depois.



Não. Os vizinhos seguiam reclamando. O MP não me chamou de novo. Vi depois no TAC que eles tinham mandado fazer medição de ruído de novo (até o dia do incêndio, o MP não havia recebido o resultado dessa medição, que tinha de ser feita pela patrulha ambiental da Brigada Militar).

"Eu achava que tinha uma boate segura"


Eu, como proprietário, não fecharia a casa por minha conta. Nós fazíamos petição ao promotor e ele deixava a gente trabalhando e vendo o que precisava. Quando a gente apresentou a documentação que ele exigiu, foi aí que eu vi que a licença de operação estava atrasada. 

Eu tinha ido na prefeitura e não achavam a pasta da Kiss. O MP diz que só tinha responsabilidade sobre a acústica. Não é verdade, eles me cobraram alvarás, sabiam que tinha licença de operação vencida.



Sim, mas por que o promotor anterior não pediu para o Alexandre (primeiro sócio)? O promotor chamou ele lá para fazer coisas (correções do barulho) e a boate nem tinha alvará de localização, trabalhou por quase um ano sem alvará. E isso não é do meu tempo.



Não pediram nada, não tem solicitação do MP. Por que para mim pediram?



Foi bom, foi ótimo.



Se eles tivessem detectado isso (a falta de documentação) no começo, que tivessem fechado. Que pedissem a documentação. Para mim, fizeram o correto, pediram tudo. Quando viram que faltavam coisas, deram prazo.



Não, eu achava que tinha uma boate segura. Eu tocava lá, minha mãe ia lá, meus familiares trabalhavam comigo, meus amigos iam lá. Se eu sonhasse que tinha algo errado, eu estaria lá dentro? Para mim a Kiss era segura. 

Como entrei em várias outras casas e nunca pensei que ia pegar fogo. Toquei em pelo menos 200 casas. Me dói escutar que a Kiss era um labirinto, uma arapuca. Eu quis entrar dentro da boate para mostrar o que era. Estou à disposição para filmar a Kiss e ir nas outras casas para ver se a Kiss era tudo isso, se era diferente. 

A Kiss era igual a qualquer outra casa. Esse labirinto está no projeto do engenheiro (entregue no TAC). Teve vistoria dos Bombeiros. Na proposta do Alexandre Costa para o MP ele apresenta fechamento das basculantes e que as portas de metal serão revestidas por espuma isolante e revestidas em couro. 

Nas portas já tinha espuma desde 2009. Vejo os acusadores falarem dessas janelas. Eu não era desse tempo, mas acredito que se tivessem me pedido, teria feito igual. Não pode ter vazamento de som. Se tem janela, tem que ser fechada.



Acho que boate deve ser feita onde não tem residência, que não liberem boate no Centro. Não só a minha teve que fazer esse TAC.



Não. Mas voltaria se precisar para provar alguma coisa. Eu não entendo (interrompe com choro).



Eu achava que estava trabalhando normal, era o meu emprego. Eu era assalariado. Eu vivia da Kiss, minha irmã vivia da Kiss. Quando falam "é um irresponsável, é um assassino, é um ganancioso", eu discordo. 

Não é verdade. Quem me pedisse cortesia, eu dava, eu fazia festas com as turmas e pagava toda a despesa da casa, eu abria a casa para fazerem colação de grau , tirar foto e não cobrava nada. 

Agora, sou ganancioso. A Kiss nunca me deu dinheiro. Eu entrei na Kiss devendo e saí devendo. Tive que pegar um sócio para poder pagar dívida. Eu não tinha como pegar. Vendi um carro, vendi apartamento, estava pagando aluguel. Tudo para poder manter (a Kiss).



Pega as notas de tudo que gastei, a marca das coisas que usei (na Kiss). Nunca poupei nada. Não existe isso. Quem não visa lucro num negócio? Eu precisava viver disso. Tinha funcionários sem carteira porque eram estudantes que precisavam ganhar um extra.



Eu estava em negociação com o Mauro bem quando fui chamado no MP. Daí ele suspendeu a negociação (para ingressar na sociedade) até eu resolver. O Mauro disse que iam me fechar e que ele estava fora. Me fez assinar um documento de que qualquer coisa de problemas anteriores, não era responsabilidade dele. Quando o TAC foi firmado, daí o Mauro começou a me ajudar.



Não. Eu não entendo porque batem tanto nessa espuma.



Tinha espuma numa lateral e atrás do palco (uma faixa de cerca de 1,5 metro) e no teto. Dizem que é da espuma, eu não acredito.



Não acredito.


Na página 33 do relatório do inquérito policial, está registrado que "a perícia constatou que a queima da referida espuma, além da produção de outros gases tóxicos também efetivamente produzia o ácido cianídrico, que foi responsável pela grande parte das mortes, conforme autos de necropsia."



De fumaça, por tudo. Eu não sei o que é o tóxico. Quem disse que se queimar papel num lugar eu não vou morrer? Eu não entendo disso. O forro de gesso e de lã de vidro queimou todo. Foi feito perícia no gesso, na lã? Não teve fumaça no primeiro instante. Daqui a pouco, foi um horror de fumaça. Falam que as luzes de emergência não funcionaram. Para a luz de emergência ser acionada, tem que cair a caixa de luz. Ela só caiu depois que os bombeiros chegaram e quebraram a caixa de luz.



Porque a Kiss era o Kiko. Todos que iam na Kiss eram meus amigos. E o único advogado, a única pessoa que está defendendo a Kiss, é o Jader (Jader Marques, advogado de Kiko). Eu sou um único que se defende e tenta dar uma explicação.



Ele é sócio como eu. E era meu concorrente. Ele cuidava do Absynto. Eu ganhava R$ 4 mil por mês para cuidar da Kiss. Tinha 50, cem coisas para cuidar. Eu cuidava das bebidas, de funcionários, de extintores, de tudo. Claro que designava tarefas, mas eu controlava tudo. O alvará dos bombeiros venceu. Aí teve discussão com quem deveria ter cuidado disso, porque se não tivesse vencido, quem sabe eu não teria ido preso.



Acho que fui preso porque fizeram de mim um irresponsável, um monstro. Tinham que dar uma resposta para mais de 200 pessoas mortas. Não iam prender ninguém? Então ficaram os músicos e os proprietários.

"Não mandava tirar os extintores"



Eu estava na rua resolvendo problema com um bêbado. Eu estava na porta junto com o segurança que fica com os canhotos. Daí o Ricardo (gerente, Ricardo Pasche) me disse que tinha um problema no palco. Pensei que era briga. Um segurança me disse que tinha pego fogo no palco e perguntou pelos extintores. 

Falei que tinha na cozinha, na cabine do DJ, do lado do palco. Olhei e não vi fogo. Nisso as pessoas começaram a sair gritando fogo.



Eu saí pela porta dos fumantes e gritando para as pessoas saírem. As portas de cima foram todas abertas. Embaixo, onde fica os caixas, as gurias disseram que as pessoas estavam indo normal pagar as comandas.


Testemunhas disseram à polícia, durante as investigações, que seguranças, nos primeiros instantes após o início das chamas, tentaram impedir que pessoas saíssem do estabelecimento sem pagar.



Uma funcionária disse isso, eu tive um grande problema com ela. Ela foi demitida por n motivos. Eu não mandava tirar os extintores.


Ex-funcionário que trabalhou na Kiss por dois anos declarou à polícia que Kiko não deixava os extintores nas paredes sob alegação de que tornavam o ambiente feio e podiam danificar a decoração. Outra testemunha, ex-funcionária, disse extintores eram escondidos embaixo de um balcão. 

Funcionário da empresa que fazia a recarga dos extintores disse, em depoimento, que os extintores sempre estavam mexidos e não ficavam no lugar. Que precisava procurá-los, pois ninguém sabia onde estavam. Que da última vez que esteve na boate, encontrou os equipamentos sob o balcão da cozinha.



Não vou confirmar porque não tenho certeza. Eu aluguei entendendo que sim. Eu coloquei no chão, com cordão de isolamento. Não tinha perigo. E tinha um cara do meu lado com extintor na mão. O negócio que usei não é o mesmo da banda.



Minha banda gravou clipe na Kiss. Ia ter uma festa da medicina, abri a casa antes para eles. Combinei de dar cervejas para eles contracenarem para mim. Tinha até cordão de isolamento. Aluguei um aparelho para isso (para os efeitos pirotécnicos). Não acendi um negócio com isqueiro. Aluguei um negócio para isso.



Eu nunca vi usarem. Nunca autorizei. Tem esse negócio da Fuel (empresa Fuel Entretenimento, cuja foto de pessoas fazenda labaredas na Kiss veio a público na época da tragédia). Me procuraram para fazer uma apresentação da Fuel, tirar fotos no pub. Foi uma locação. Essa foto foi feita de tarde, não tinha ninguém lá, era foto para apresentar o trabalho deles. Eu nunca contratei a Fuel.


Na página 83 do relatório do inquérito policial está dito que "...proprietários contratavam espetáculos com uso de fogos... que eram cotidianos". O vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, disse que nunca foi advertido por Elissandro sobre a realização de show pirotécnico. 

Dois ex-funcionários afirmaram que era comum a realização de shows pirotécnicos na boate. Um segurança disse que, no dia da tragédia, um extintor foi deixado próximo ao palco, porque a banda faria show pirotécnico.



Nesse local onde estavam não tinha espuma. E eles tinham extintores. Nunca se pensou em pegar fogo.

"Eu não sabia a capacidade da casa"



Sim, isso copiei de outras casas. Essa vela diz na embalagem que é fogo frio para locais internos. A banda está dizendo que tem fotos de que usavam sempre artefatos na Kiss. Eu quero ver essas fotos. E que isso estaria em contrato. Não existe contrato. Não julgo eles de achar que ele quis fazer isso. Ele não acordou de manhã e pensou " vou colocar fogo na Kiss".



Esse PM é um amigo meu pessoal. Eu dava gasolina para ele me acompanhar. Eu ajudava com algo que ele precisasse. Não tinha facilitação para a Kiss. Eu achava que a Kiss até era perseguida. O Conselho Tutelar foi lá, a polícia (Brigada Militar) foi lá quatro ou cinco vezes para ver se os seguranças tinham documentos necessários.



Não. É ridículo. A gente recolhia identidades falsas de quem tentava entrar.



Meu primeiro contato com os Bombeiros foi em 2011, quando venceu o alvará. Fui, no mínimo, dez vezes lá pedir a vistoria. Sempre a gente estava na fila de espera. Foram fazer a vistoria. Detectaram que faltava mais luzes de emergência e que tinha que trocar as barras antipânico. Eu pedi se eles sabiam quem fazia isso. 

Me indicaram a empresa Hidramix, que era de um colega deles ou da mulher do colega. Na minha cabeça pensei que pegando empresa de Bombeiro eu estava seguro, pois tudo seria feito corretamente.



Nunca me pediram isso, e acho que não pediram para os antigos sócios. Eu nem sabia que tinha que ter isso. Falam muito em rádio (radiocomunicador para os seguranças) também. Que lugar tem? Se tivessem me pedido, eu teria colocado. Se tivessem me pedido para abrir duas ou três portas, eu tinha feito.



Nada. Falam também da quantidade de pessoas (capacidade).



No dia da fiscalização dos Bombeiros, a gente conversou. Eles disseram que gostavam de festa, se podiam ir na Kiss. Eu disse que daria cortesia. Mas não dei e eles nunca foram. Ficamos conversando e eu disse que não sabia a capacidade da casa.


A engenheira Josy Maria Gaspar Enderele, que elaborou o primeiro projeto de prevenção de incêndio, em 2009, atestou que a capacidade da boate era de 691 pessoas. 

Peritos indicaram que a lotação máxima era de 769 pessoas. Segundo a Polícia Civil, esse cálculo seria "para condições ideais, sem os guarda-corpos de metal, com iluminação, rotas de fuga, extintores, ventilação e exaustão, portas de emergência, enfim, todos os itens de segurança adequados." Além disso, 125 testemunhas declararam à polícia que havia "mais de mil pessoas na festa" e 17 citaram haver "entre mil e 2 mil pessoas".



Nunca peguei um documento na mão, não tinha noção.



Com base em conforto. Eu tinha um limitador.



Pela circulação. Eu fiz testes. Com 900, com mil pessoas. O consumo com mil era menor do que o consumo com 700 por causa da circulação. A gente estipulou de 700 a 800. Perguntei para o Bombeiro sobre a capacidade. Ele deve lembrar. 

Ele disse que "por lei é duas pessoas por metro quadrado. A casa aqui tem 700 metros quadrados, é 1,4 mil, tira bares e banheiros, pode trabalhar com mil, 1,2 mil". Esse era meu parâmetro. Eu nunca tive acesso ao documento. 

Acredito que seja uma falha minha, mas no alvará isso não está escrito.



Quando fomos notificados, mandei pagar e fazer tudo que precisava. Paguei taxa e fiz recarga dos extintores.



Fomos sim, disseram que estávamos na fila.



Não. Eu queria a vistoria logo. Podiam vir fechar. O MP estava em cima, o TAC não tinha acabado. Até janeiro eu ainda estava em função do TAC. O alvará sanitário fomos ver antes de vencer. Fomos na prefeitura, tinha uma greve. Minha preocupação sempre foi o TAC, achava que iam fechar a boate. 

Na prefeitura não achavam a pasta da Kiss, me passavam de um para outro. Chegaram a dizer que eu teria que refazer toda a documentação da Kiss, até estudo de impacto de vizinhança. Quando o promotor pediu, aí eles encontraram a pasta da Kiss



Não, foi anterior a mim.


Dois inquéritos decorrentes da tragédia da Kiss estão em andamento na Polícia Civil em Santa Maria. Um deles apura se houve fraude na confecção do estudo de impacto de vizinhança e laudo acústico da Kiss. Apura fraude na elaboração dos documentos, aceitação deles pela prefeitura e emissão de alvará em desconformidade com a legislação.



Não sou técnico. Eu tinha uma banda que tocava na Kiss. Agendei umas bandas para eles. Me ofereceram comprar uma parte da boate. Não tinha dinheiro. Eles aceitaram o meu carro e R$ 15 mil.



Desconhecia. Quem administrava antes era o Alexandre.



Olhei o que estava na parede, que é o de localização e o dos Bombeiros. Se tinha o de localização entendi que estava tudo em dia.



Não conheço ninguém. Eu achava que a Kiss era perseguida.



Nunca gostei de política. O Bisogno nunca foi na boate. Conheci ele numa reunião sobre fumo em outra boate.



Capaz, nunca. Eu achava até que o Schirmer morava em Porto Alegre.



Não.



Não. pelo contrário, eu tinha pavor da prefeitura, da desorganização, de fazer a gente de bobo, de ir lá várias vezes para conseguir documentação.

Não saí lá de dentro da Kiss ainda. Eu acordo e durmo pensando.


Não saí lá de dentro da Kiss ainda. Eu acordo e durmo pensando. Estou sem dormir desde o depoimento da Nat ( Nathalia Daronch, mulher de Kiko, depôs no fórum de Porto Alegre semana passada). 

Tomo quatro tipo de remédios que deveriam derrubar um boi e não durmo. Não consigo arrumar emprego. Quem vai me dar emprego? Estava procurando emprego. Na verdade, não tenho como sair na rua.



Estava no mercado esses dias, tinha um rapaz e a mãe dele. Eu estava com a minha filha e minha mulher com o carrinho. E ele ficou tentando chamar a mãe para me mostrar. Acho que pensam que a gente está fugido, escondido. Eu não sou um bandido. De um dia para outro, virei assassino. Todos que estavam lá eram meus amigos, a maioria, ninguém queria uma coisa dessas.



Me pergunto isso todos os dias.Não tenho como competir com a dor das famílias, não tem como competir com a morte. Se eu pudesse, eu daria minha vida para qualquer um dos filhos deles voltar. Se eu pudesse não ter tido aquela bosta (a boate), eu não ia ter. A imagem que têm é de ganância, que não tinha alvará. Não é verdade.



Ela tinha alvará, desde os outros donos. Eu comprei com alvará. Que não tinha engenheiro para obras. Tinha. Nada era clandestino. Não era uma boate clandestina. Todos os órgãos públicos estiveram lá. O MP esteve lá fazendo medição, passou nas barras, pela mesma porta. Tudo lá foi visto. Se tinha algo errado, por que não fecharam?



Eu ia morar lá para sempre. A família da minha mulher é de lá e não posso ir lá. Alguns amigos tentam entrar em contato comigo. Eu queria poder. Tive que abandonar tudo lá e vir morar de favor aqui.



Estou rezando que passe. Nunca mais vou esquecer. Não tem como esquecer. Lembro de tudo. Como foi um horror para as pessoas, para mim também foi.



Eu tenho responsabilidades, quero saber quais são. Confiei nos órgãos públicos. Quero deixar o recado para donos de casas noturnas, empresários: não confiem nos órgãos públicos, pois eles não sabem o que estão fazendo, não sabem o que cobrar. Eu confiei e hoje estou aqui. Poderia ter acontecido com qualquer boate, com qualquer lugar. Tudo que me pediram, fui fazendo.



Essa espuma tem em qualquer lugar. Eu não tinha como saber se tem gás ou não. Se tivesse escrito que a espuma pode matar, eu não usaria. Deveria ser proibido de fabricar. Tenho dito para o Jader (advogado) que além do MP, além da prefeitura, quero do meu lado (respondendo pela tragédia) a fábrica. Por que fabricam, quem libera? Se eu tenho que responder, têm que estar do meu lado Bombeiros, prefeitura, Ministério Público.



Não. Como vou imaginar uma coisa dessas.

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