Um ano depois das eleições municipais, os partidos reforçam as filiações para aglutinar nomes e alterar os quadros
partidários no Ceará, com 2026 no horizonte.As articulações evidenciam uma tendência da última década: a aglomeração de prefeitos em poucas siglas a partir da força de lideranças políticas, como é o caso do PSB e do PT, que concentram mais de 65% das prefeituras cearenses.
Com a chegada de sete novos filiados na sexta-feira (3), o PSB alcançou o índice de 72 prefeitos no Ceará, somando forças em um partido que já era hegemônico nesse quesito. Enquanto isso, o PT tem o comando de 48 prefeituras. Sob a liderança de Cid Gomes (PSB) e Camilo Santana (PT), ambas as legendas compõem o núcleo da base do governador Elmano de Freitas (PT).
O cenário de aglomeração de prefeitos evidencia também a dificuldade de agremiações menores em manterem representatividade local, onde há casos de partidos que são usados para eleger políticos em anos de disputa, mas acabam perdendo força após o período eleitoral.
Nesse sentido, o PRD é o principal exemplo: terminou o último pleito com cinco prefeitos, mas perdeu todos eles após a migração do grupo do ex-prefeito de Eusébio, Acilon Gonçalves, para o PSB.
Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres analisa que o cenário da política cearense é marcado pela noção da capacidade dos líderes de atraírem partidos e pela cultura de incentivo à busca por alianças com aqueles que os aproximam da máquina pública, o que é crucial para a manutenção das bases eleitorais.
É nessa conjuntura que os partidos menores vão perdendo espaço. A pesquisadora avalia que, levando em conta as novas regras eleitorais, sobretudo as cláusulas de barreira, essas legendas estão sendo cada vez mais esvaziadas e enfraquecidas.
“Do ponto de vista prático, as legendas menores vão tender, com o tempo, a se esvaziar e se enfraquecer. E aí qual a solução? Fusão, federações, para tentar tornar as legendas competitivamente eleitoralmente mais competitivas. No caso do Ceará, você tem essas legendas, no caso do PSB, que até ontem era uma legenda também inexpressiva, com a migração do Cid Gomes, que é esse grande articulador político estadual, conseguiu, digamos, fazer o partido ressurgir das cinzas”
TENDÊNCIA DE AGLOMERAÇÃO
O contexto de concentração pode ser entendido a partir das movimentações partidárias de lideranças cearenses, como Cid Gomes. Hoje líder isolado do número de prefeituras no Ceará, o PSB tinha apenas oito prefeitos até 2020. Entretanto, o rompimento do senador com o PDT, em 2022, fez a sigla entrar em um período de crescimento.
O cenário é diferente de 2012, dois anos após a reeleição de Cid Gomes como governador pelo PSB. O partido saiu daquela disputa com 39 prefeituras, índice que o colocava na dianteira, mas não de forma isolada, sendo seguido de perto por PT (30), PSD (27) e PMDB (21) em números de prefeitos filiados.
Em 2013, Cid e aliados saíram do PSB e foram para o Pros — extinto após fusão junto ao Solidariedade em 2023. A movimentação motivou o esvaziamento do partido socialista. Em 2015, foi a vez do senador migrar para o PDT com o seu grupo político, contribuíram para alterar o patamar do partido brizolista no Ceará.
O cenário de aglomeração começou a ser consolidado no pleito de 2016, quando Cid e outros nomes, como Ciro Gomes e Roberto Cláudio, ajudaram o PDT a conquistar maior número de prefeituras no Ceará: 52. O pódio era fechado por PMDB (25) e PSD (18).
Em 2020, esse índice chegou a 67 prefeitos, distanciando o PDT das outras duas siglas com mais gestores, PSD (28) e PT (18). Juntas, as agremiações respondiam por 74% das prefeituras do Ceará.
Em 2024, com a consequente filiação de Cid e de outros aliados após o rompimento com o PDT, 37 novos prefeitos passaram a compor os quadros do PSB e renovaram as forças do partido. A curva ascendente foi reforçada no pleito eleitoral do mesmo ano, quando o PSB saiu das urnas com 65 prefeituras. Agora, a sigla conquistou mais sete, chegando ao total de 72.
A conjuntura de domínio do PSB e do PT também pode ser explicada pela força política de Camilo Santana. Após dois mandatos de governador do Ceará, o agora ministro da Educação consolidou a liderança estadual ao ajudar a eleger Elmano de Freitas no 1º turno em 2022, além de aglutinar prefeituras, o que incluiu a vitória de Evandro Leitão (PT) em Fortaleza.
MOVIMENTAÇÃO DAS LIDERANÇAS
Monalisa Torres comenta que, historicamente, os políticos cearenses tendem, majoritariamente, a se vincular aos partidos muito mais pela fidelidade e pela relação política e pessoal que mantém com certas lideranças, do que propriamente pela identidade ideológica ou programática que teriam com a legenda.
A pesquisadora lembra que, na década de 80, sob a liderança do então governador Tasso Jereissati (PSDB), a sigla tucana chegou à marca de cerca de 80 prefeituras no Ceará, número que o PSB se aproxima. Nesse contexto, figuras como Camilo Santana e Cid Gomes se destacam pela capacidade de articulação, construção de acordos e montagem de alianças.
“Há uma uma lógica de proximidade, de construção de alianças, de redes políticas com essas lideranças mais fortes, porque essas lideranças mais robustas conseguem ter um acesso muito mais facilitado, seja à máquina pública do Estado, seja a outras esferas de poder. E é a construção dessa rede, que funciona como uma espécie de elemento que galvaniza as lideranças em torno desse chefe político maior”
Monalisa aponta, ainda, que em 2022, com o racha dos Ferreira Gomes com o PT, houve uma certa reorganização das forças políticas no estado, o que fortaleceu Camilo Santana como chefe político. Isso, avalia a especialista, fez com que o ministro da Educação ganhasse até mais peso como líder do que quando era governador.
“Ainda que o governador fosse Camilo (em 2022), Camilo não competia pelo mesmo espaço de Cid, digamos assim, eles estavam do mesmo lado. Agora, embora eles continuem aliados do governo do estado, cada um tenta ali manter o seu raio de influência”, pontua Monalisa Torres.
DIFICULDADE PARA OPOSIÇÃO
A movimentação das lideranças expõe, ainda, os desafios de partidos da oposição que, mesmo consolidados, não conseguem formar uma lista de gestores nas cidades cearenses. É o caso do PL, que não possui prefeito filiado em seus quadros no estado, embora tenha expoentes como o deputado federal André Fernandes (PL), atual presidente da legenda no estado.
Isso, analisa Monalisa Torres, pode ser explicado pela força das lideranças estaduais e essa tendência de vinculação, que está muito mais ligada à figura do chefe político do que propriamente à ideologia do partido.
“Num estado como o Ceará e outros estados que têm características semelhantes, é muito difícil ser oposição. Porque para você mudar, conseguir construir uma aliança forte, atrair aliados, conquistar voto, ampliando a base eleitoral, é preciso ter recurso da máquina, ter capacidade de construir obras, de realizações e essas realizações são facilitadas ou não a depender da distância que você está da máquina pública”
No caso do PL, o atual cenário é diferente de quando o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) era comandado por Acilon Gonçalves no Ceará. Sob liderança do ex-prefeito de Eusébio, a sigla chegou a ter 13 prefeituras em 2020.
Como analisa Monalisa, a atual direção do PL tem um componente ideológico muito mais forte do que tinha na época em que era comandado pelo Acilon, de caráter mais pragmático para a costura de alianças. Isso, avalia a professora da Uece, causou uma mudança de estratégia do partido.
“Do ponto de vista quantitativo, praticamente voltou a ser nanico, voltou a ser inexpressivo. Ainda que tenha quadros que, do ponto de vista eleitoral, consiga aí arregimentar muitos votos. O André Fernandes, em Fortaleza, se tornou uma das principais lideranças da oposição no Ceará, e sobretudo pelo desempenho que demonstrou nas eleições de 2024”, pontua Monalisa Torres.PONTO DO PODER
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