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sábado, 13 de novembro de 2021

BOLSOLÃO AMEAÇA A DEMOCRACIA

Por ipuemfoco   Postado  sábado, novembro 13, 2021   Sem Comentários



Ainda é recente na memória política brasileira o escândalo do Mensalão, que revelou ao País um esquema abjeto de compra

de votos no Congresso por meio de dinheiro público desviado. Foi um marco no combate à corrupção. 


Quase dez anos depois, o Petrolão escancarou manipulação semelhante, dessa vez com o uso de recursos da Petrobras, que quase quebrou. Mesmo com o avanço no combate aos crimes do colarinho branco, o Centrão, em acordo com Jair Bolsonaro, desenvolveu uma nova forma de fraudar a vontade dos eleitores por meio de verbas bilionárias distribuídas para garantir apoio político.


O novo esquema, ao contrário do que aconteceu no passado, não se traduz na distribuição direta de dinheiro para uso pessoal. Trata-se de recursos distribuídos por ministérios, principalmente o da Saúde e do Desenvolvimento Social, para obras paroquiais e eleitoreiras que abastecem as bases e reforçam o poder de parlamentares aliados ao governo. 


Em tese, são gastos legítimos, mas o fato de serem repassados de forma escusa e seguindo interesses políticos afronta a Constituição. É uma negação dos princípios da “impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” exigidos para o Orçamento. E a própria CGU já aponta indícios fortes de superfaturamento em convênios que vieram a público na aquisição de equipamentos agrícolas, o escândalo do tratoraço. Essa pode ser apenas a ponta do iceberg.

FIRME A ministra Rosa Weber, do STF, diz que o uso das emendas “causa perplexidade” (Crédito:GABRIELA BILO)


A forma encontrada para driblar os órgãos de controle e escapar do olhar da população se deu por meio das chamadas emendas de relator (RP-9), que representam só neste ano R$ 18,5 bilhões do Orçamento. Ao contrário das emendas individuais (R$ 9,6 bilhões) e de bancadas (R$ 7,3 bilhões), as emendas de relator omitem o autor do pedido. 


Trata-se de um verdadeiro orçamento secreto à disposição do governo (que chancela os gastos) e dos seus aliados no Congresso. A gravidade do caso fez a ministra do STF Rosa Weber interromper a execução dessas emendas no último dia 5, por força de liminar, decisão que foi referendada pela ampla maioria da Corte (por 8 a 2). Numa sentença dura, que apontou incompatibilidade com o regime democrático.


“Causa perplexidade a descoberta de que parcela significativa do orçamento da União esteja sendo ofertada a grupo de parlamentares, mediante distribuição arbitrária entabulada entre coalizões políticas, para que tais congressistas utilizam recursos públicos conforme seus interesses pessoais”, escreveu. 


Para embasar sua decisão, citou parecer do TCU que já havia apontado o grande aumento no uso desse instrumento. “Não é competência da Câmara trocar voto por emenda. O STF, sob pena de ser conivente com a variante do Mensalão, não poderia deixar de proibir a prática da imoralidade. O Supremo cumpriu seu dever de guardião da Constituição”, elogiou o jurista Miguel Reale Jr. Trinta e cinco entidades, incluindo a Transparência Brasil, divulgaram uma nota pública se opondo às emendas de relator.


O orçamento secreto virou a grande arma do governo para aprovar a PEC dos Precatórios, que Bolsonaro considera vital para sua reeleição. Parlamentares relataram que foram oferecidos até R$ 15 milhões por deputado para se aprovar a medida. Às vésperas da votação em primeiro turno dessa proposta, entre 1º de outubro e 8 de novembro, o governo empenhou nada menos do que R$ 3,3 bilhões para essas emendas. 


Dados obtidos pela ISTOÉ, a partir de um levantamento da ONG Contas Abertas, apontam que o governo federal destinou entre os dias 28 de outubro de 5 de novembro repasses para prefeitos ligados a parlamentares da base aliada filiados ao PP (do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira e do presidente da Câmara, Arthur Lira), bem como ao DEM (do ex-presidente do Senado, Davi Alcolumbre) e ao PL (futura legenda do presidente, presidida pelo mensaleiro Valdemar Costa Neto).

Divulgação


O município que ocupa o topo da lista é Pouso Alegre, no interior de Minas Gerais. O governo reservou R$ 28,7 milhões para a administração municipal. A cidade é comandada por Rafael Tadeu Simões (DEM) que, nas redes sociais, mostra ser bastante próximo do deputado federal Bilac Pinto, também do DEM. 


O dinheiro foi empenhado para executar projetos de desenvolvimento sustentável e custear assistência hospitalar prestada na cidade. A prefeitura de Teresina (PI) também garantiu uma fatia dos recursos para cobrir esse mesmo tipo de despesa. A cidade, controlada por José Pessoa Leal (MDB), aliado de Ciro Nogueira, é o segundo município que mais teve verbas empenhadas nesse período: R$ 26,4 milhões.


Outro município contemplado foi Rio Branco, no Acre. O prefeito Tião Bolacom (PP), inclusive, faz questão de publicar em suas redes sociais o momento em que pediu recursos federais com a ajuda de parlamentares amigos. No Instagram, Bolacom publicou uma foto ao lado do senador Sérgio Petecão (PSD). 


“Assinatura do ofício de solicitação de propostas de emendas! 5/10/2021”, escreveu o prefeito na legenda da imagem que mostra ele e o parlamentar assinando o documento. Outro caso curioso é o de Macapá, cujo prefeito, Dr. Furlan (Cidadania), só chegou ao cargo após derrotar o irmão do senador Davi Alcolumbre (DEM) no ano passado. Foram empenhados R$ 17,2 milhões, destinados à execução de obras de infraestrutura e serviços de Saúde. 


Dr. Furlan e Alcolumbre, no entanto, tentam mostrar que deixaram a rivalidade no passado e que hoje trabalham juntos para levar verbas para a capital do Amapá. Os dois aparecem em um vídeo na internet em que o prefeito anuncia a chegada de recursos federais.


Redutos eleitorais de Bolsonaro estão entre as que mais têm empenhos. No Rio, o município de Petrópolis conta com R$ 11 milhões para a Saúde. O prefeito da cidade é Hingo Hammes (DEM), que é próximo aos deputados Hugo Leal (PSD) e Dr. Luiz Antonio Teixeira Jr (PP). No mesmo estado, Campos de Goytacases, região de influência dos Garotinho, ficou com R$ 20,7 milhões. 


O município é governado por Wladimir Garotinho, irmão da deputada Clarissa Garotinho (PROS). Questionada, a prefeitura comunicou que tinha uma dívida de R$ 200 milhões quando o prefeito assumiu o cargo e que, graças a sua experiência como deputado federal, ele tem conseguido firmar parcerias que levam recursos para a cidade. Feira de Santana (BA) ficou com R$ 23 milhões, garantidos pela deputada Dayane Pimentel (PSL) — ex-correligionária de Bolsonaro (ela votou contra a PEC dos Precatórios) — para seu aliado Colbert Martins Filho (MDB). 


Em nota, a prefeitura informou que ainda não foi comunicada sobre esse empenho. E afirmou que as relações do prefeito com a deputada Dayane é “meramente institucional”. Procurados pela reportagem, os outros políticos citados no levantamento não quiseram se pronunciar.


Também na reta final das discussões sobre a PEC, outros empenhos milionários beneficiaram redutos eleitorais de aliados do governo. A verba de R$ 23 milhões para Arapiraca (AL) atendeu aos interesses do próprio Arthur Lira. Seu pai, Benedito de Lira, prefeito de Barra de São Miguel (AL), foi beneficiado com R$ 3,8 milhões para obras via Codevasf, órgão que é dirigido no estado pelo primo de Lira, João José Pereira Filho. 


O presidente do PL fluminense, Altino Côrtes, garantiu investimentos milionários para São Gonçalo (RJ) e Itaboraí (RJ). E o uso das emendas de relator já corria solta para atender os interesses do governo no Congresso. O próprio Alcolumbre havia conquistado R$ 277 milhões para obras e equipamentos, via Ministério do Desenvolvimento Regional.


O proveito político do orçamento secreto já vinha sendo criticado pelos especialistas. “É uma nova forma de barganha entre Legislativo e Executivo, mas sem a transparência e o escrutínio necessários. Aproveitou-se uma brecha na legislação”, disse à ISTOÉ Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente, do Senado Federal. 


“É gravíssimo. Corrompe a democracia e, acima de tudo, é inconstitucional. A lei não permite que os recursos sejam alocados aos parlamentares posteriormente à execução do Orçamento”, afirmou Júlio Marcelo de Oliveira, procurador do Ministério Público junto ao TCU, que teve um papel fundamental ao denunciar as pedaladas fiscais no governo Dilma Rousseff. 


Até o vice-presidente, Hamilton Mourão, defendeu o fim das emendas de relator. Para ele, decisão do STF foi oportuna porque “é preciso dar o máximo de publicidade” no repasse de recursos. Ainda assim, deputados já estudavam manobras para manter o orçamento secreto por outros meios. Um deles seria destinar os recursos diretamente para os ministérios, o que deixaria os beneficiários no anonimato. 


Tiraria poder do presidente da Câmara, mas ele poderia controlar os recursos indiretamente. Outra forma seria passar a usar outro tipo de repasse, as chamadas emendas de comissão, pelas quais também não é possível identificar os responsáveis pelas indicações. Para frear esse movimento, parlamentares da oposição tentam criar uma CPI. Ela já foi apelidada de “CPI do Bolsolão”.

EM FAMÍLIA Benedito de Lira, pai de Arthur Lira, foi beneficiado com emenda (Crédito:Ailton de Freitas)

PEC dos Precatórios

Mesmo após o STF suspender a farra das emendas de relator, elas garantiram a aprovação em segundo turno da PEC dos Precatórios, por 323 votos a 172. Foi um placar mais folgado do que no primeiro turno, quando a proposta conseguiu apenas quatro votos a mais do que o mínimo necessário (308). 


O episódio mostrou que o governo conseguiu cooptar parte da oposição. A PEC cria um espaço orçamentário de R$ 95 bilhões, nos cálculos de Salto. Viabilizar o novo Bolsa Família foi a desculpa encontrada para o calote nos precatórios, mas o verdadeiro objetivo é driblar o teto de gastos e escancarar a porteira para mais gastos no ano eleitoral. Uma das primeiras medidas deve ser ampliar o bilionário Fundo Eleitoral. 


“A alteração significa que o Brasil é incapaz de ter uma regra fiscal. Sempre que alguém quiser gastar mais, vai dar um jeito. É uma demonstração que o teto de gastos acabou”, critica o economista Marcos Mendes, um dos responsáveis pela criação desse instrumento. 


A implementação do teto garantiu o equacionamento da dívida pública e o ciclo de baixas históricas na taxa de juros, agora revertidas. “Estamos voltando ao regime antigo, só quem sem espaço para aumentar impostos ou a dívida pública. Como vamos financiar esse aumento de gastos? A incerteza vai além do que será o Orçamento de 2022. É por isso que os indicadores econômicos estão tão deteriorados”, afirma.


O efeito dessa farra com o Orçamento já se reflete na economia. A inflação medida pelo IPCA chegou a 10,67% em 12 meses, aproximando-se da máxima registrada no colapso do governo Dilma. “A dívida vai aumentar e os juros também. Tudo isso vai derrubar o crescimento. Por isso que o Orçamento não é uma questão técnica, mas envolve todos”, resume Salto. Analistas também consideram que o calote nos precatórios terá como efeito a multiplicação dessas dívidas nos próximos anos, que pode chegar a um montante trilionário. 


Após passar na Câmara, a PEC ainda precisa ser votada em dois turnos no Senado, onde o governo tem menos apoio. Mas é possível que esse trâmite seja facilitado, se depender do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco. Ele criticou o STF e defendeu as emendas de relator, rechaçando qualquer associação do esquema com compra de votos. 


O relator da matéria no Senado será o próprio líder do governo na Casa, Fernando Bezerra Coelho, um dos campeões do orçamento secreto. A expectativa é que a PEC seja aprovada até o começo de dezembro. Bolsonaro espera ver os benefícios da PEC em sua popularidade no Nordeste, uma das regiões em que o novo Bolsa Família pode produzir efeitos para garantir a sua reeleição. Para a população, o resultado será visto no bolso e nos indicadores econômicos daqui para a frente.

TRATORAÇO CGU viu sobrepreço em compras com emendas de relator (Crédito:Divulgação)

Calote atinge idosos e deficientes

Anunciada falsamente como um projeto para beneficiar os pobres, a PEC dos Precatórios é um desastre para quem lutou por anos para receber seus direitos na Justiça. Aposentados e deficientes são os maiores prejudicados. Com sua eventual aprovação, o Congresso e o governo devem jogar milhões de aposentados, pensionistas e demais beneficiários do INSS, como pessoas deficientes e famílias indenizadas por morte, em uma completa incerteza. 


Eles têm direito a receber, de forma prioritária, um terço (R$ 31 bilhões) do montante que a União deveria pagar no ano que vem, de R$ 89 bilhões. A mudança na lei significa não apenas o possível adiamento (a lei prevê apenas R$ 40 bi para essas despesas), mas a dúvida se um dia o dinheiro chegará. “Muitos precisam do dinheiro para pagar dívidas após a crise da Covid”, diz Tonia Galetti, diretora do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi). Ela vai tentar reverter os efeitos da PEC no STF. Além deles, entram na conta do calote alguns estados (cerca de R$ 16 bilhões) e pessoas com processos judiciais já transitados em julgado.

PRÓ-EMENDAS Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco diz que STF se equivocou (Crédito:Ueslei Marcelino)

Medida pode dar R$ 5 bi a partidos

Além de ser apontada como forma de viabilizar o Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família, a PEC dos Precatórios é uma manobra para turbinar o Fundo Eleitoral. A proposta garante dinheiro suficiente para turbinar os recursos reservados do Orçamento para financiar os partidos durante as campanhas, fazendo o montante saltar de R$ 2 bilhões para R$ 5 bilhões. 


O aumento foi discutido neste ano durante a análise da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, em julho. A expectativa era turbiná-lo para R$ 5,7 bilhões. Com a repercussão causada por essa cifra inédita, Bolsonaro foi obrigado a desagradar seus aliados e a vetar esse trecho da proposta. Na época, deixou a questão em aberto, para que o valor fosse negociado depois. 


“A PEC do Calote destina, dos mais de R$ 90 bilhões que abre de folga fiscal, apenas cerca de R$ 40 bilhões ao programa de assistência social. Basta fazer as contas e se perguntar para onde irão os mais de R$ 50 bilhões restantes. Certamente não irão para os bolsos dos mais pobres”, ironizou o senador Fabiano Contarato (Rede-ES). “Em ano eleitoral, a sanha caloteira do governo e de seus apoiadores do Centrão só pode ter um fim: a reeleição.”

NOTA DE ESCLARECIMENTO

O gabinete da deputada federal Professora Dayane Pimentel esclarece que nunca destinou R$ 23 milhões de reais em emendas extras do orçamento secreto a município nenhum, nem mesmo ao de Feira de Santana (BA). Ao todo, para Feira de Santana, em emendas impositivas, o mandato da deputada federal Professora Dayane Pimentel destinou R$ 11.675.134,65 entre 2020 e 2021, para Saúde, Educação, Esporte e Infraestrutura do município.

Informamos que a deputada não é aliada política do atual prefeito Colbert Martins (MDB), informação já pronunciada pela própria Prefeitura: a relação é meramente institucional. Contudo, atrelar o nome da Professora Dayane Pimentel ao “balcão de negócios” é além de fake news, uma injustiça ao trabalho de quem é justamente combativa a essa prática. A deputada é opositora ferrenha do presidente Jair Bolsonaro e contrária a todo tipo de vantagens ilícitas denunciadas no Bolsolão. Inclusive votou contra a PEC dos Precatórios.

Rompida com o presidente desde outubro de 2019, no primeiro ano da atual legislatura, Pimentel se destaca dentre as parlamentares que mais combatem o bolsonarismo e a velha forma de fazer política, no Congresso Nacional e no debate na esfera pública. Por fim, é importante salientar que nenhum contato da equipe da Istoé, que escrevia a matéria, foi feito com nossa Assessoria de Imprensa. As revistas impressas circulam com uma  informação errônea, absolutamente destoante da realidade. Buscamos por meio dessa uma retratação pública por parte da Revista Istoé.

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