O presidente censura o comandante da Força, em ato jamais visto no País, e atua para que Pazuello não seja punido por indisciplina.
Com isso, ele incentiva a desordem nos quartéis, o que serve a seus delírios golpistas.
Pelas regras militares, o ex-ministro teria de passar da ativa para a reserva. O comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e demais membros do Alto Comando chamaram-no a uma reunião para encaminhar essa solução.
Pazuello não a quis, e tudo ficou bem – ou seja, sob a guarda de Bolsonaro, o “nosso gordinho” do “meu Exército” seguiu vida normal, pelo menos até a tarde da quinta-feira. O Regulamento Disciplinar também fixa prisão por dez dias, mas os oficiais que defenderam essa posição deram um tiro n’água – logo se saberá se os disparos atingiram também os seus próprios pés, caso sejam aposentados por ordem do Planalto.
Diante disso, o general Paulo Sérgio abriu uma mera apuração disciplinar, o máximo conseguido em meio à tanta pressão de Bolsonaro para que houvesse condescendência com Pazuello. Ainda assim, Bolsonaro, que estava no Equador na posse do presidente de extrema direita Guillermo Lasso, telefonou para Braga Netto e proibiu que o Exército tornasse público o teor da nota que trata da abertura desse processo.
A publicidade a fatos dessa natureza é um princípio republicano. Bolsonaro o atropelou. E Paulo Sérgio, sem a menor obrigação regimental, se submeteu ao autoritarismo
Não somente o comandante do Exército mas também parte do Alto Comando deixaram-se amordaçar (generais como Orlando Geisel e Leônidas Pires Gonçalves devem ter-se sentido alvejados na eternidade). Há militares submissos que veneram o capitão, há militares submissos que discordam dele mas põem panos quentes em situações delicadas – são oficiais de “fritar bolinhos”, como os definia Golbery do Couto e Silva.
As Forças Armadas estão divididas, e é justamente esse o objetivo do presidente. Bolsonaro é, de fato, o comandante em chefe das Forças Armadas, mas isso não lhe dá o direito de censurar ninguém. E os militares, por sua vez, não são obrigados a obedecer ordens inconstitucionais.
“Os princípios da obediência têm limites”, escreveu o ex-porta-voz da Presidência general Otávio Rêgo Barros. E criticou o comportamento frouxo de escalões fardados frente ao autoritário Bolsonaro, que o tempo todo interferiu para que o ex-ministro não fosse punido imediatamente como deveria sê-lo. Segundo Rêgo Barros, isso traz o “efeito colateral da corrupção lato sensu. Da corrupção moral, a genitora de todas as outras corrupções”.
Na quinta-feira, Paulo Sérgio e Braga Netto viajaram ao Amazonas para se encontrarem com o presidente e rediscutirem a necessidade de punição ao ex-ministro, em nome da não desmoralização das Armas.
Há militares submissos que veneram o capitão, há militares submissos que discordam dele mas põem panos quentes em situações difíceis — são de “fritar bolinhos”, como os definia Golbery do Couto e Silva
Por que Pazuello recusou-se a ir para reserva quando instado por Paulo Sérgio? Resposta: com a sua reconvocação à CPI e em meio aos comentários de que dessa vez será preso se mentir, ele sentiu-se mais seguro mantendo-se na ativa, até porque alguns oficiais bolsonaristas, nos bastidores, fizeram correr a notícia de que jamais tolerariam ver um general em atividade recebendo voz de prisão.
Bolsonaro precisa, mais do que nunca, de que Pazuello o livre de responsabilidades pelo genocídio na pandemia, e por tal motivo o incentivou a não aceitar a passagem à reserva. Mais: declarou que poderá revogar qualquer punição que Paulo Sérgio venha a lhe aplicar. Quando estava na ativa, Bolsonaro fazia proselitismo sindical nos quartéis e ameaçou jogar bomba na Vila Militar.
Agora, na Presidência do Brasil, incentiva a indisciplina na caserna. É desse “meu Exército”, bagunçado e dividido, que ele necessita para viabilizar seus delírios golpistas.FONTE ISTOÉ
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