A frágil saúde pública brasileira recebeu uma injeção de ânimo no dia 8 de julho de 2013, quando a Medida Provisória nº 621 lançou o Programa Mais Médicos.
Entre as propostas, explicitadas no site do Ministério da Saúde (www.portalsaude.saude.gov.br), o Programa tenta remediar o baixo índice (1,8) de médicos por mil habitantes e a desigualdade de distribuição desses profissionais (22 estados estão abaixo da média nacional).
Convertida, em outubro daquele ano, na Lei 12.871, a injeção prescrita pelo Governo Federal provocou reações adversas em parte da classe médica.
Vagas “para atuar na atenção básica de periferias de grandes cidades e municípios do Interior”, aponta o Programa, foram oferecidas “prioritariamente a médicos brasileiros” e não foram preenchidas.
Abriu-se uma brecha para os estrangeiros e, atualmente, segundo o Ministério, 80% dos médicos que participam do Programa são cubanos.
A implantação do Mais Médicos afetou a relação entre o Governo Federal e a classe médica brasileira. De um lado, manifestaram-se críticas contra a formação e a postura de médicos brasileiros.
Do outro, a ausência do Revalida (exame nacional que reconhece o diploma de profissionais estrangeiros) e a falta de investimentos na saúde pública foram denunciados. Feridas expostas, acusações e xingamentos contaminaram discursos e o diálogo foi para a UTI.
O quadro se agravou por uma “comunicação inadequada de ambos os lados... Não houve diálogo. Diálogo é uma arquitetura e significa você ter uma agenda, dizendo quem são os atores do diálogo e quais são os critérios. Isso nunca aconteceu”, considera o psicanalista Valton de Miranda Leitão, articulista do O POVO.
Ele examina, com cuidado, as críticas ao Programa que “causou impacto entre os médicos por razões, em parte válidas, e outras muito obscuras”. “A necessidade urgente de atender populações subservidas de medicina exige, do governo, medidas que ultrapassam certas exigências estabelecidas pelas sociedades médicas”, compreende.
A vinda dos médicos cubanos preencheu vazios assistenciais no País, completa o médico e professor Henry de Holanda Campos, vice-reitor da Universidade Federal do Ceará. “E houve também um ressentimento (de médicos nacionais), que acho justificado, porque se centrou muito a deficiência do sistema de saúde na figura do médico. E sabemos que tem problemas graves de infraestrutura. Agora, sem levar o profissional, você não vai conseguir melhorar o sistema. Com a chegada do profissional, houve estímulo à melhora e a investimentos”, conclui.
Neste caminho, a imagem dos profissionais locais foi distorcida, aponta o presidente do Sindicato dos Médicos do Estado do Ceará (Simec), José Maria Pontes: “Foram agressões gratuitas. Eles (Ministério da Saúde) passaram a agredir os médicos, dizendo que não querem ir para o Interior. Não vão porque não tem condições (de trabalho). Tudo o que queríamos, eles não cederam em nada e ainda acabaram com o Revalida”.
Trabalhando em hospitais públicos há mais de 30 anos, “desde estudante, estagiário”, o presidente do Simec não tem prognóstico para o restabelecimento do diálogo com o (novo) governo Dilma Roussef.
“Para nós, os problemas continuam. É todo mundo chateado e revoltado porque fomos injustiçados, como se não tivéssemos valor... Ter carreira de estado, concurso público, Revalida: são pontos que a gente não abre mão. Propor, já propusemos. Na hora que ela (presidente Dilma) acabou o Revalida, fechou os canais de diálogo”.
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