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sábado, 16 de agosto de 2014

EDUARDO CAMPOS; UM HOMEM E SEU TEMPO

Por ipuemfoco   Postado  sábado, agosto 16, 2014   Sem Comentários

Na tarde da terça-feira 12, Eduardo Campos estava surpreendentemente calmo para alguém que, dali a poucas horas, passaria pela sabatina de William Bonner e Patrícia Poeta no “Jornal Nacional”. 

Nada de media training, reuniões com assessores ou memorização de números. Depois de uma visita ao cardeal Orani Tempesta, arcebispo do Rio de Janeiro, junto com sua companheira de chapa, Marina Silva, Campos seguiu para o hotel Sofitel de Copacabana. 

Lá, brincava com o filho caçula, Miguel, de apenas 6 meses, enquanto conversava descontraidamente com a mulher, Renata. “O menino era o centro das atenções”, diz o deputado federal licenciado Walter Feldman (PSB), que acompanhava o candidato à Presidência em compromissos de campanha na capital carioca. “O Miguel estava sem camisetinha, só de fralda, no clima do Rio.”
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Na bancada do “JN”, Campos enfrentou uma entrevista difícil – foi questionado seguidamente sobre o lobby político para emplacar a mãe, Ana Arraes, no Tribunal de Contas da União, em 2011 –, mas considerava que tinha “vencido”. Ou, para usar a brincadeira que havia feito horas antes com jornalistas, escapado do pior. 

“Espero que o Bonner não queira ser a bala que matou Odete Roitman (personagen assassinada na novela “Vale Tudo”, de 1988) comigo”, disse antes da sabatina. Depois dela, fez outra piada ironizando a entrevista: “Uma parte dos 15 minutos é utilizada para as perguntas incômodas e aí você fica com sete minutos. Falar de tudo em sete minutos nem locutor de corrida de cavalos consegue”. Eufórico, decidiu participar de um chat com internautas ao lado de Marina Silva, contrariando a programação inicial. 

No bate-papo, citou Gandhi (“Melhor que fale por mim a minha vida do que as minhas palavras”) e defendeu a escolha da líder da Rede Sustentabilidade para o posto de vice. Só então foi comemorar, no restaurante do hotel, num jantar com Renata, Miguel e assessores. 

Nesse ponto, por volta das 23h, Marina e Feldman já tinham decidido não embarcar no jatinho que Campos utilizaria para ir ao Guarujá (SP) no dia seguinte. “Achamos melhor ir direto para São Paulo, onde faríamos uma reunião na casa dela”, diz Feldman. Decisão que lhes salvaria a vida. Antes de ir dormir, Campos se despediu dos aliados: “Bom, pessoal, a gente se fala amanhã”.
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De madrugada, o candidato à Presidência ligou para o aliado Márcio França (PSB-SP). Pediu ao deputado que o representasse nos eventos marcados para logo cedo na cidade do litoral paulista. 

O motivo: queria descansar um pouco e passar mais tempo com a família antes de retomar a jornada eleitoral. Até ali, Campos já tinha viajado 36 mil quilômetros em busca de votos pelo Brasil. 

Para isso, utilizava um jato executivo Cessna Citation 560XLS+, prefixo PR-AFA, fabricado em 2010, que tinha pouco mais de 350 horas de voo quando foi alugado pelo comitê de campanha. Não era uma aeronave luxuosa – até onde é possível dizer isso de jatinhos privados –, mas era conveniente. 

Levava nove passageiros, além dos dois pilotos, operava bem em pistas curtas, tinha autonomia de 3.440 km/h e atingia velocidade máxima de cruzeiro de pouco mais de 800 km/h.

Na manhã da quarta-feira 13, Campos tomou café com a mulher e o filho em Copacabana e seguiu para o aeroporto Santos Dumont. O plano de voo até a Base Aérea de Santos – que fica no Guarujá – havia sido apresentado à torre de controle às 22h36 do dia anterior. 

Previa decolagem às 9h29. Campos era famoso por sua pontualidade, e o Cessna deixou o solo às 9h21. A bordo estavam, além do candidato, o ex-deputado e assessor pessoal do pernambucano, Pedro Valadares, 48 anos, o assessor de imprensa Carlos Percol, o cinegrafista Marcelo de Oliveira Lyra e o fotógrafo Alexandre Severo Gomes da Silva, todos de 36 anos. 

Os responsáveis por conduzir a aeronave eram o piloto Marcos Martins, 42 anos, que acompanhava o presidenciável desde maio, e o copiloto Geraldo da Cunha, 44 anos, que substituía um colega aniversariante.
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O voo até o litoral sul paulista demorou meia hora. Às 9h50, na aproximação final à Base Aérea de Santos, as condições meteorológicas estavam longe daquelas que os pilotos consideram ideais. Havia um leve vento de través – aquele que atinge o avião lateralmente –, chovia e a visibilidade era limitada (leia quadro). 

O cenário estava muito próximo do mínimo aceitável para pouso naquela pista de 1.390 metros. 

Os procedimentos finais eram feitos por instrumentos: os pilotos usavam informações de altitude e velocidade fornecidas pelos medidores do avião, baixando gradativamente, de acordo com as orientações da carta de aproximação elaborada pela Aeronáutica. 

Para encontrar o local de pouso sem enxergá-lo, seguiam um radiotransmissor colocado em solo. Essa tecnologia, chamada de NDB (non-directional beacon), é considerada ultrapassada para grandes aeroportos, mas ainda é muito utilizada em pistas menos importantes.

Pouco depois das 9h50, ainda sem conseguir enxergar a pista, o piloto Marcos Martins tomou a decisão de abortar o pouso para realizar uma nova aproximação. À torre de controle, disse as seguintes palavras: “Controle São Paulo, Papa Romeo Alfa Fox Alfa vai fazer a Echo Uno da pista 35… Vai fazer o bloqueio de Santos e o rebloqueio, ok?”. 

Em linguagem leiga: ele iria arremeter e tentar pousar novamente. Como manda a carta de aproximação para aquele aeroporto, o piloto fez uma curva à esquerda, passando sobre o centro da cidade de Santos (SP). 

Deveria subir a 1.200 metros e aguardar instruções. Quase no fim da trajetória de parábola, no entanto, o avião perdeu altitude, passou entre dois prédios, caiu sobre uma área de residências e comércios e explodiu. Nenhum dos sete ocupantes sobreviveu. Em solo, houve apenas feridos sem gravidade.



A equipe de Eduardo Campos não demorou para perceber que algo estava errado. Márcio França, que tinha visto o jatinho arremeter, logo depois soube da informação equivocada de que um “helicóptero havia caído em Santos”. Quando os assessores do candidato à Presidência não conseguiram fazer contato com nenhum dos membros da comitiva, os temores cresceram. Feldman, que estava em São Paulo, relata os momentos de tensão. “Primeiro veio a notícia da queda de um helicóptero, depois do avião”, diz. “Era desesperador, mas ainda havia dúvida. Marina foi ficando profundamente triste”, conta. A confirmação de que a aeronave acidentada era mesmo de Eduardo Campos saiu perto do meio-dia. Antes das 13h, todos já sabiam que não havia sobreviventes. “Foi quase indescritível para todos”, diz Feldman. “Homens e mulheres choravam copiosamente.”

Na busca pelas causas do acidente, há poucas certezas. Os pilotos eram experientes e o avião estava com todas as inspeções em dia. 

O gravador de voz (CVR) da cabine, recuperado na tarde de quarta-feira, chegou ao Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), em Brasília, perto da meia-noite, mas não será de grande utilidade. Segundo a Aeronáutica, o equipamento não gravou os diálogos do voo de Campos. As duas horas de áudio disponíveis são de uma viagem anterior. 

Ainda não se sabe o que causou o problema. O jatinho também não estava equipado com o gravador de dados (FDR), que não é obrigatório em aeronaves desse porte. Esse fato, embora não inviabilize a investigação, deixa o trabalho mais difícil e demorado. “Os dados são um reforço para o que foi colhido, mas não são necessariamente a base e o início das investigações”, diz Mateus Ghisleni, comandante e diretor da Secretaria de Segurança de Voo do Sindicato Nacional dos Aeronautas. 

Para os especialistas ouvidos por ISTOÉ, por enquanto, é possível apenas afirmar que as condições climáticas foram um dos fatores que podem ter contribuído para a queda. O procedimento de arremetida, segundo eles, é previsto e deve ser executado sempre que o piloto não considerar seguras as condições para aquele pouso. 

“É uma medida de segurança totalmente normal”, diz Humberto Branco, vice-presidente da Associação de Pilotos e Proprietários de Aeronaves. “A partir daí é que vem o mistério da causa do acidente, de entender o que aconteceu.”

Testemunhas em solo disseram que o avião estava em chamas no ar. Um piloto ouvido pelo Cenipa afirmou, no entanto, que viu a aeronave sem nenhum sinal de fogo, em alta velocidade e com inclinação acentuada, mergulhar em direção ao solo. 

A cratera profunda e o alto grau de destruição indicam um choque desse tipo. “Nessas horas, os peritos do Cenipa precisam dar especial atenção às evidências físicas”, diz um engenheiro aeronáutico ligado à indústria da aviação que prefere não se identificar. “Os relatos iniciais podem ser muito discrepantes, fantasiosos até, e precisam ser corroborados por fatos.” 

A resposta a esse mistério estará nos destroços fumegantes coletados no local da queda. De acordo com a Aeronáutica, não há prazo para a conclusão das investigações.

“Pela janela, vi uma labareda de seis metros”

Dono da casa onde caiu o avião Cessna 560 XL relata os momentos de caos e desolação desde a fatídica manhã da quarta-feira 13

Rodrigo Cardoso

Foi no quintal da casa do advogado Paulo Ivo Homem de Bittencourt, 86 anos, que morreu o candidato do Partido Socialista Brasileiro (PSB) à Presidência, Eduardo Campos, aos 49 anos. 

O proprietário, que se recuperava de uma luxação na clavícula, havia retornado de uma sessão de fisioterapia minutos antes da queda do Cessna 560 XL, prefixo PR-AFA, nos fundos de seu sobrado, que fica em um terreno de 580 metros no número 113 da rua Alexandre Herculano, no bairro do Boqueirão. Bittencourt estava na copa do imóvel, lendo jornal e sorvendo um mingau de aveia, quando, antes de dar a segunda colherada, viu o prato virar depois de um barulho estrondoso. 

O jato havia se chocado com o muro e os bambuzais do fundo de seu sobrado, a 12 metros de onde o idoso se encontrava. “Pela janela da cozinha, vi uma labareda de seis metros mais ou menos. 
Aí, me dei conta do que era e liguei para os bombeiros”, afirma.

Nem os Bittencourt, que moram na rua há 41 anos, nem ninguém da vizinhança perdeu a vida. Seis pessoas foram encaminhadas para a Santa Casa de Santos com ferimentos ou por terem inalado gás em decorrência do acidente. 

Ao ver que nada havia acontecido com o pai, a psicóloga Maria Ester Pettinati Homem de Bittencourt, 49 anos, uma das filhas que moram com o advogado, dirigiu-se até a sala para agradecer a Deus. 

“Coloquei um joelho no chão e fazia o sinal da cruz, quando houve uma segunda explosão. Com ela, a porta dos fundos voou na minha direção e só não acertou a minha cabeça porque eu estava ajoelhada”, diz. No total, 36 apartamentos e dez casas foram interditados para que peritos, bombeiros e funcionários da Defesa Civil trabalhassem na busca por corpos e destroços do jato.
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Foi só por volta das 19h30 daquela fatídica quarta-feira 13 de agosto que o advogado Bittencourt voltou a se alimentar. Comeu um pedaço de pizza em uma padaria, amparado por outros seis familiares. 

Protegendo a cabeça da chuva contínua daquele dia com uma espécie de capa prateada cedida por um bombeiro, ele perambulou pela rua anestesiado, preocupado com o sobrado da família. 

Ao seu lado, a filha, que acreditava não ter se acidentado porque ajoelhou para rezar, segurava um terço e mostrava um escapulário de Nossa Senhora das Graças. “Moro naquela casa desde 1971. 

Nesses 43 anos, criei meus quatro filhos e tenho muitas boas lembranças. Quero entrar para ver como está, o que precisa ser feito, porque quero continuar a minha história lá”, diz ele.
Fotos: Walter Mello, Delamonica/Folhapress; Paulo Whitaker/Reuters; Claudio Gatti; Rosana Braga, Domingos Peixoto/Ag. o Globo; Calebe Simões/Ag. Isto

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