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quinta-feira, 3 de junho de 2021

O MATA-MATA DE MESSIAS

Por ipuemfoco   Postado  quinta-feira, junho 03, 2021   Sem Comentários



Bolsonaro não hesitou mesmo um único segundo. Consultado na manhã da última segunda, 31, pela Conmebol sobre a

possibilidade de realização da Copa América no Brasil, deu um sim de pronto, sem titubear ou pedir tempo para refletir. 


Eis uma agilidade que o País inteiro gostaria de ter visto quando o assunto, deveras mais premente, foi o da compra de vacinas ou de oxigênio, em situações extremas, enquanto inúmeros brasileiros morriam em Manaus por asfixia à espera das deliberações federais que não vieram. 


O diligente e solícito mandatário, quando a pauta são as demandas de cartolas do esporte bretão, mostrou-se em outras ocasiões um rei da catimba, do jogar de lado, um engavetador contumaz de providências bem menos comezinhas e arriscadas tal essa de um torneio de futebol em péssimas circunstâncias. 


Por que Bolsonaro — fica a pergunta —, tanto descaso, desleixo e falta de sensação de urgência diante das onze vezes em que a Pfizer ofereceu imunizantes redentores aos brasileiros, com meses de antecedência, e o senhor protelou a opção? 


Por que mandatário — é necessário repetir, dada à dúvida —, o senhor mandou desfazer o contrato de aquisição de doses da Coronavac, alegando não ter pressa para vacinas? 


E as semanas preciosas, perdidas em divagações (quem sabe!), entre o apelo dos amazonenses e o efetivo envio dos cilindros de oxigênio e insumos básicos para salvar vidas, ocorreram exatamente em virtude do que, capitão? 


Nos dê uma luz! O que aconteceu nessas ocasiões extremas para a sua criminosa demora, sabendo que cada minuto faria a diferença em vidas? O “mito” de araque não se cansa de exibir provas inequívocas e caudalosas das prioridades tortas que abraça. 


Em plena hecatombe da Covid, com o Brasil de joelhos frente à doença, prestes a encarar uma terceira onda, dá esse aceno a um espetáculo que tem de tudo para contribuir com o agravamento do quadro. Definitivamente, ele não se emenda. Mover mundos e fundos para a realização da Copa América, que foi recusada pelos vizinhos, Argentina e Colômbia, justamente por oferecer perigo aos cidadãos, é, no mínimo, flertar com a irresponsabilidade. 


Virologistas são unânimes em alertar que a ideia de “mesclar” pessoas de tantos países, em um mesmo lugar, com tamanha diversidade de variantes do SARS-Cov-2 à disposição, é de uma estupidez sem tamanho. Algo que deveria ser proibido por qualquer autoridade minimamente comprometida com a saúde e as precauções sanitárias indispensáveis frente à pandemia. 


Não existe lógica na aceitação pelo Brasil de um evento como esse agora. Ao contrário. Bolsonaro, entretanto, não segue a lógica, muito menos o bom senso. Pouco se importa com os índices de óbitos e os cuidados para conter o avanço da doença. Fica configurado mais um dos movimentos descabidos em sua sanha genocida e de adesão à necropolítica. 


O mandatário e seus devotos — que costumeiramente esnobam a vida alheia e exibem indiferença em meio à dor de famílias enlutadas — acabaram por construir um ambiente de insanidade no País, onde escolhas absurdas como essa parecem a coisa mais natural do mundo. O torneio já vem sendo chamado como a Copa da Morte. 


E por motivos óbvios. Afinal, é preciso estar no apogeu da loucura, tal qual um Nero que mandou queimar Roma, para concordar de bate-pronto com uma estultice que pode selar o destino nacional na condição de campeão mundial da Covid. É esse o troféu que o capitão almeja em meio a um dos mais dramáticos momentos vividos pela Nação? Só pode. Diga-se, de passagem, há método na loucura. 


O que faz Bolsonaro remete às gestões mais ditatoriais da história. “Pão e circo” sempre foi o lema de caudilhos totalitários que buscam mascarar os problemas e tragédias cotidianas do povo, materializando eventos diversionistas dessa natureza. Bolsonaro, certamente, almeja ganhar tempo e narrativa enquanto as taxas de contágio da Covid não cessam e a mortandade, inegável pelas estatísticas, desafia sua recondução ao poder. 


Em mais de 200 cidades do Brasil e em diversas partes do mundo, um protesto sonoro, poderoso, de resistência a sua administração e repúdio às escolhas desmioladas que fez, assustaram o mandatário dias atrás. Não há dúvida. Mesmo incrédulo, ele percebeu que o grito dos excluídos e dos que clamam por vacinas está crescendo dia a dia, sem que ele possa fazer mais nada. 


Passou do tempo para medidas sensatas no plano da saúde e a Copa América, imagina, pode lhe trazer alguma trégua no bombardeio em andamento. Trégua para saber o que fazer, para traçar nova estratégia. Bolsonaro está emparedado. Não apenas pela pandemia. As ameaças de blecaute por uma crise hídrica, de greves pelo desemprego, de aumento da inflação e do endividamento público sem controle, lhe colocaram na arena dos espetáculos sombrios e ele quer trocar de show. 


Com os processos de impeachment, acusações de crimes à humanidade e desmandos de toda a ordem lhe subindo ao pescoço, entendeu como melhor saída a entrega de distrações ao distinto público. O Brasil já é mesmo o pária do planeta e apesar de tamanha burrada não pode descer mais na escala de governos deploráveis. Bolsonaro vai agora para uma espécie de mata-mata. 


Não no sentido futebolístico das boas decisões. No contexto literal mesmo. Termos usuais da peleja como “eliminatórias” nunca soaram tão tenebrosas. Quem sobreviverá ao fim e ao cabo desse campeonato burlesco de estupidez? Quando as portas dos estádios se abrirem, o Brasil, provavelmente, já terá alcançado a terrível marca de meio milhão de mortos, a segunda maior do planeta, em escala crescente. 


Ao final do campeonato, hospitais e UTIs terão o inglório papel de contar mais e mais derrotados pelo espetáculo de imprudência promovido pelo capitão. Decerto ele dobrou a aposta contra os críticos. Com perdão do trocadilho, amplia a “Cova das Américas”. 


No Brasil de irresponsabilidades mil, levado por um capitão que adora aglomerações, caberia talvez, a contento, que durante as partidas o Hino Nacional viesse adaptado, em uma versão, digamos, mais adequada à ocasião, cantada na base do “vírus do Ipiranga”, tendo por mascote a célula da Covid e com a distribuição gratuita de cloroquina aos espectadores. 


A prosopopeia estaria assim completa. O escárnio federal não será esquecido e deverá cobrar o preço nas urnas. A demagogia barata legará, invariavelmente, a morte de outros milhares de inocentes. É surreal a mensagem de descaso que o inquilino do Planalto passa à população. Mas, para ele, o mata-mata parece ser apenas uma das etapas da loteria da existência. 


Como diz: “faz parte” ou “é da vida”. Eventuais bandeiras a tremular nos estádios estarão definitivamente manchadas de sangue, como símbolos da destruição moral de um povo. Na Berlim, às vésperas do Holocausto, uma Olimpíada serviu de pano de fundo para mascarar a monstruosidade em andamento. 


Megaeventos dessa natureza viraram instrumentos de manipulação das massas, enquanto barbaridades são cometidas nos bastidores. Bolsonaro repete o script.

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