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segunda-feira, 17 de outubro de 2016

MAGISTRADA NEGA TER NEGOCIADO HABEAS CORPUS

Por ipuemfoco   Postado  segunda-feira, outubro 17, 2016   Sem Comentários


Desde que a segunda fase da Operação Expresso 150 foi deflagrada pela Polícia Federal, no último dia 28/9, a desembargadora cearense Sérgia Miranda, 57, diz estar vivendo na base de tranquilizantes. 

“De repente, minha vida virou de ponta-cabeça”, comenta a magistrada que foi afastada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ela é suspeita de envolvimento na venda de pelo menos quatro liminares nos plantões do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) em 2012 e 2013. 

Sérgia Miranda afirma que se “receberam um real ou um milhão”, por conta de habeas corpus concedidos por ela, o esquema de corrupção não teria se dado com a “participação, o conhecimento ou a autorização” dela.

“Nunca recebi proposta (de pagamento) para nada do que eu fiz na minha vida como desembargadora nem como juíza. Sou uma pessoa honesta”, diz Sérgia Miranda, magistrada há 30 anos. Confira os principais trechos da entrevista ao O POVO.

O POVO - Os 12 volumes do processo da venda de liminares estão na Internet... 

Sérgia Miranda - Li cada página. A Polícia Federal disponibilizou para nós as mídias das interceptações de presos conversando com advogados sobre preços e acertos. Há muito mais do que foi publicado pela imprensa. Eu e o meu filho, que é promotor, passamos três dias ouvindo e em nenhum momento eles mencionam meu nome.

OP - O nome da senhora aparece em conversas de WhatsApp. Principalmente envolvendo os advogados Michel Coutinho, Fernando Feitosa e Carlos Eduardo Miranda.

Sérgia - Sim, tem um WhatsApp do dia 14/12/2012, é o que mais a imprensa bate. Eles dizem que a “Sérgia Miranda abriu as portas do presídio” e que deferi oito HCs (habeas corpus) no plantão. Nunca deferi oito HCs. Acredito que esse foi o número de processos que entraram, deferi dois. Como eu abri as portas do presídio com dois HCs? A conversa é dia 14/12, mas se referem a outro momento. Quando eles (advogados) continuam a conversa é que você vai entender que estavam falando de outro momento e de dinheiro já recebido. Meu plantão tinha sido dia 17/11/2012. 

OP - Nesse plantão entraram oito processos?

Sérgia - Não posso dizer com certeza. Acho que sim. Não posso entrar no TJCE, pedi uma certidão para checar. 

OP- Os dois HCs foram em favor de quem?

Sérgia - Em nome de Jones Leite Ferreira (o primeiro). Qual o fundamento da minha decisão? O paciente (réu) se encontrava preso há dois anos e as certidões que estavam nos autos davam conta da inexistência de que o acusado tinha envolvimento com a prática delituosa que estava no processo. 

OP - Mas ele era traficante investigado pela PF?

Sérgia - Me parece que esse processo era coletivo e, nos processos coletivos, as condutas têm de ser individualizadas. É preciso também que vocês entendam um contexto. Em 2012, não tínhamos Internet no plantão. Não tínhamos acesso ao processo do primeiro grau e os processos eram em papel. A única coisa que a gente tinha eram os documentos que vinham com o pedido que o advogado instruia. 

OP - Os plantões são para casos urgentes. Soltar esse traficante era urgente?

Sérgia - Isso era uma causa urgente porque a alegação era de excesso de prazo. 

OP - Mas o juiz de origem do processo não era quem deveria ter decidido?

Sérgia - Sim. Só que ele estava há dois anos preso e o juíz não decidia. A prisão em flagrante foi em 26/12/2010. “Extrai-se do presente que o paciente Jones Leite Ferreira não tem envolvimento na prática reiterada de crimes”. Se eu disse isso, é porque tinha certidão nos autos do habeas corpus que me diziam. 

OP - A senhora não teve acesso ao processo, apenas ao que os advogados levaram?

Sérgia - Sim, é o que chegou na minha mão. Você tem de resolver o que estava no plantão e não o que está fora. Não havia prática reiterada de crime, conforme certidão apresentada nos autos, e por isso “seu encarceramento por este lapso temporal não deve permanecer”. E juntei uma súmula do Supremo (STF) que diz que a proibição de liberdade provisória nos processos por crime hediondo não veda o relaxamento por excesso de prazo.

OP - A decisão foi cassada pela 2ª Câmara Criminal do TJCE. 

Sérgia - Não foi confirmada. A câmara entendeu que o caso era complexo. Revogou sob o entendimento que o excesso de prazo para a formação da culpa estaria justificado pela complexidade da causa. Veja bem, sou desembargadora do cível e fui juíza do cível por mais de 20 anos. Então, não tenho no meu conhecimento rotineiro quem é bandido e quem não é. Conheço porque leio o jornal, porque me informo, mas uma coisa é um juiz do crime estar no plantão. Outra coisa é o juiz do cível. 

OP - A senhora deveria ter se julgado insegura para deferir uma liminar dessa natureza?

Sérgia - Não me julguei insegura exatamente porque havia documentos que os advogados estavam me levando e poderia conceder a liberdade. 

OP - A senhora recebeu proposta em dinheiro de advogados ou de intermediários para conceder a liminar?

Sérgia - Nunca recebi nenhuma proposta para nada do que eu fiz na minha vida como desembargadora nem como juíza. Sou uma pessoa limpa, honrada, honesta. Nunca recebi proposta de pessoa que possa ter dito que estava falando em meu nome sem minha autorização. Porque nunca dei autorização nem para minha mãe. Se tivessem feito propostas, eu teria chamado a Polícia e lavrado o flagrante. É crime. 

No judiciário sabemos que somos vendidos todos os dias. Porque alguns advogados, principalmente os advogados dessa qualidade (os 14 que estão sendo investigados pela PF/STJ), chegam por aí e dizem que se derem tantos reais para os juízes, eles deferem essa liminar. Eles têm 50% de chance de errar.

OP - E sobre a segunda liminar que a senhora concedeu?

Sérgia - Foi de José Adriano da Cunha. Ele se encontrava preso há dez meses sem se iniciar a instrução criminal. Essa foi confirmado pela Câmara Criminal. Deferi com base na demonstração de excesso de prazo na formação da culpa. (Adriano era do grupo do traficante Raimundinho da Padaria, que controlava a distribuição de drogas na Maraponga. Foram presos em maio de 2012. Ele não é citado pela PF). 

OP - O advogado Fernando Feitosa, apontado pela PF como um dos mais ativos na venda de liminares do plantão do TJCE, fala como intermediador da senhora.

Sérgia - Nunca vi esse rapaz, nunca troquei uma palavra com ele. Conheço o pai dele, meu colega de muitos anos. Desses advogados citados, só conheço um que trabalhou num júri na época em que eu era juíza do júri em 1993/95. Esse Mauro Rios. No cível, não me lembro dele.

A gente que está no cível há 20 anos, só conhece os advogados estrelas. O de porta de cadeia, não. E quem circulava no plantão? Eram sempre os mesmos advogados. No meu gabinete, não atendia diretamente a eles. Quando raramente atendia, era em caso em que o advogado tem de contextualizar uma situação. Como nas demandas de assistência médica, em que ele precisa explicar pessoalmente. Isso não quer dizer que ele está fazendo uma incursão indevida.

OP - Há possibilidade de a investigação mostrar que o patrimônio da senhora é incompatível com o salário?

Sérgia - Nenhuma. Segundo minha declaração de imposto de renda (mostra a documentação), o saldo da conta poupança do Banco do Brasil, em 2015, é de R$ 239,60. O saldo de CDB é R$ 24 mil. E outra poupança, da Caixa Econômica, R$ 750. Tem um terreno rural em Baturité, adquirido em 2008, com benfeitoria no valor de R$ 200 mil. 

OP - Em 2008?

Sérgia - Anterior a essas denúncias. Foi pago através de alienação de uma sala comercial pelo valor de R$ 95 mil e mais empréstimo consignado que fiz. Na declaração tem ainda a construção de uma casa na área rural (em Baturité). Parte do dinheiro para isso era próprio e o restante do empréstimo consignado. Fiz dois empréstimos. Comprei este imóvel, foi quando saí da Unifor, em 2007. Tinha 15 anos de universidade e juntei o dinheiro com o empréstimo que pago até hoje.

OP - E a declaração de 2012, ano das liminares suspeitas?

Sérgia - Tá aqui. Casa adquirida na rua Antônio de Castro, na Cidade dos Funcionários, pelo BEC. Comprei em 1994 e morava com meus filhos. Lá, fomos vítima de um assalto violento, com arma na cabeça e tentativa de sequestro dos filhos. Depois do assalto, me mudei para um apartamento alugado e aluguei a casa. 

Vendi a casa, em 2012, para comprar este apartamento (Dionísio Torres) por R$ 580 mil. Eu tinha R$ 100 mil na conta poupança. Também tinha um veículo Gol. Na declaração constam ainda: R$ 183,05 de poupança e CDB de R$ 8 mil. Na Caixa Econômica, tem um saldo de R$ 4.470 e uma conta corrente de R$ 17 mil. 

OP - A PF pode tido acesso a uma conta que a senhora nunca declarou ou bem em nome de laranja?

Sérgia - Não existe. Tenho conta no Banco do Brasil, Caixa Econômica e BNB. 

OP - Por que o Fernando Feitosa anunciaria que o plantão da senhora era bom pra negócio?

Sérgia - Vejo muita pabulagem na conversa deles.Ele diz aqui: “Sábado (18/5/2013) tem plantão ok. Sérgia Miranda”. Meu plantão não foi sábado. Estava no plantão no dia 26/5/2013.

OP - E quais foram HCs desse plantão? 

Sérgia - Deferi dois. Um em favor de José Aroldo Ximenes Coutinho (traficante de drogas). Ele se encontrava preso há 90 dias sem denúncia do Ministério Público. Denúncia de réu preso são dez dias. O caso era do município de Granja. A Câmara Criminal revogou porque, quatro dias antes do meu plantão, o promotor tinha entregado a denúncia em Granja. Não tinha condição de saber disso. 

OP - Mas esse era um caso para se decidir em um plantão?

Sérgia - Agora não é mais, existem plantões regionais. Em2012/2013, o Ceará estava praticamente sem juízes. O que mais se levava para os plantões era excesso de prazo porque não tinham juizes suficientes nas comarcas. Uma pessoa presa há três meses, não interessa se ele empurrou alguém, se matou, se traficou... O Ministério Público tinha de ter o cuidado de oferecer a denúncia. 

OP - A senhora foi legalista?

Sérgia - Com certeza. Hoje se chama garantista. 

OP - E faria novamente da mesma forma? 

Sérgia - Nessa mesma condição, faria. A não ser que eu soubesse que era alguém que tivesse traficado 300 quilos de drogas. Não tinha informações, só certidões. 

OP - Hoje a senhora vê essas situações como artimanhas de advogados? 

Sérgia - Nós estamos olhando com olhos de hoje. Naquele momento, não sabia que existia essa rede de tráfico de influência. Nem o Tribunal. Soube disso quando foi denunciado pela imprensa e pelo desembargador Gerardo Brígido (ex-presidente do TJCE). 

O sigilo fiscal e bancário dos três filhos da desembargadora Sérgia Miranda serão postos à disposição da Justiça e da Polícia Federal. Segundo Miranda, ela pode ter errado por excesso de legalidade ao soltar traficantes de drogas investigados pela Polícia Federal. Mas não por ter vendido liminares em plantões do TJCE. Ela mandou soltar criminosos investigados pelas polícia Federal e Civil.

Um deles, Jones Leite Ferreira, foi preso pela PF em 27/12/2010 com mais quatro traficantes. Eles transportavam 356,2 kg de cocaína, droga da Bolívia. Jones era defendido pelo escritório de Michel Coutinho, apontado pela PF como integrante do grupo de advogados que corrompia desembargadores. Segundo Delano Cerqueira, superintendente da PF no Ceará, “Jones saiu pela porta da frente do presídio com uma liminar sem respaldo legal”. 

A PF investiga ainda se houve paga pela liberdade de José Aroldo Ximenes Coutinho, acusado de tráfico de drogas. Ele havia sido preso pelo Ministério Público e Polícia Civil durante a Operação Depurare, em 8/3/2013, em Granja. Aroldo tinha duas passagens pela Denarc (2004 e 2007) e uma pelo extinto Carandiru (SP). A advogada Jéssica Simão Albuquerque e Michel Coutinho defendiam o traficante. 

O 3º habeas corpus considerado suspeito pela PF é de Evilásio Pereira da Silva. Ele foi solto em 15/7/2012. Evilásio, defendido pelo escritório de Michel Coutinho,foi preso em flagrante com 20 kg de cocaína em Fortaleza. Em maio de 2012. 

A quarta liminar que a PF investiga é a que soltou Francisco Adailton Leite. Defendido por Mauro Rios, ele foi preso por porte ilegal de arma no Crato. Segundo o delegado federal Wellington Santiago, conversas registradas no WhatSapp do advogado e outras provas indicariam um acordo, mediante paga, para soltar Adailton.

A Expresso 150 investiga 23 advogados, sete intermediários e, também, os desembargadores Carlos Feitosa, Francisco Pedrosa, Paulo Timbó e Váldsen Alves.

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