ALEXANDRE PADILHA; "DENGUE NÃO É DOENÇA DE POBRE"

Nas primeiras três semanas do ano, a cidade de São Paulo registrou quase 30 novos casos de dengue por dia. Foram 528 ocorrências atestadas por exames – um aumento de 40% em relação ao mesmo período de 2015. 

O secretário municipal de saúde, Alexandre Padilha, fala sobre as dificuldades de combate ao mosquito Aedes aegypti.

O secretário municipal de Saúde de São Paulo, Alexandre Padilha (de branco), e o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, em ação contra o Aedes aegypti (Foto: Fabio Arantes/Secom/Divulgação)

ÉPOCA – Qual é a autocrítica que o sr. faz em relação ao combate à dengue na cidade de São Paulo?

Alexandre Padilha – Ninguém vai enfrentar a dengue sozinho. Isso é uma autocrítica ao município, ao Estado, ao governo federal, à imprensa, à população. É fundamental que as pessoas façam faxina em casa. Na cidade de São Paulo, 85% dos focos de dengue estão dentro das residências. Para virarmos o jogo, temos que trabalhar em conjunto. Até os hospitais privados, que em 2015 foram responsáveis por mais de 40% dos óbitos na capital.

ÉPOCA – O que está acontecendo nos hospitais privados? Os profissionais não estão capacitados para enfrentar a dengue?

Padilha – Existia uma cultura no país de que dengue era doença de pobre. Algo que só aparecia em hospital público. Quando temos uma epidemia como a que tivemos na cidade de São Paulo no ano passado (100 mil casos na capital e 700 mil no estado de São Paulo), isso revela para as pessoas que o mosquito não escolhe classe social, não escolhe fronteiras, não escolhe sexo, raça. Ele pega todos.

Todos têm que agir e estar preparados para o combate à dengue. É lógico que os casos são muito mais concentrados em regiões onde há um histórico de problemas nas condições de moradia e de saneamento. Onde há mais interrupção da oferta d’água – sobretudo na periferia. Mas ele pega todo mundo. Essa cultura de que a dengue é uma doença que só pega a população mais pobre é uma cultura que muitas vezes leva todo mundo a não agir como deveria no sentido de combater o mosquito dentro de sua casa.

ÉPOCA – A situação vai piorar?

Padilha – A prefeitura está bastante preocupada. Fevereiro é um mês mais quente, com chuvas intermitentes. Muito mais propício para a proliferação do mosquito. É por isso que os casos de dengue na cidade de São Paulo acontecem a partir do mesmo de fevereiro até o mês de maio. É justamente o período de maior infestação. Trabalhamos com um cenário potencialmente grave, o da repetição do mesmo quadro que tivemos em 2015 em relação ao número dos casos. Até porque o interior do estado de São Paulo e o litoral paulista tiveram mais da metade dos casos do Brasil. A metade dos óbitos do país ocorreu nessas regiões. Esse cenário tem o potencial de chegar até a capital. Por isso estamos bastante preocupados e intensificando as ações de combate aos focos do mosquito.

ÉPOCA – O sr. foi ministro e agora é secretário municipal de saúde da maior cidade do país. No que diz respeito à dengue, o que é mais fácil?

Padilha – Nada é fácil. Tudo é desafio. A grande lição que o Brasil precisa ter é que o mosquito não é federal, não é estadual, não é municipal, não é público, nem é privado. O mosquito gosta do ser humano. De estar ali onde tem gente. Nós temos que nos mobilizar para reduzir não só o número de casos, mas reduzir o número de casos graves principalmente, o número de óbitos.

Estou preocupado em mobilizarmos nossa população. Estamos diante de uma crise de saúde pública extremamente grave. Se numa crise como essa as pessoas ficarem preocupadas em bater boca e trocar acusações nós seremos fortemente derrotados. Numa crise como essa, temos que estar todos juntos, com a energia concentrada.