OLHO NO VOTO.A CIDADE ESQUECIDA QUE O INTERESSE ELEITORAL FAZ ENXERGAR

No ano de 2016, recomeça a temporada de passeio pelas periferias das cidades.
De olho na disputa municipal, políticos saem dos gabinetes para as ruas em busca da simpatia dos votantes. 

Ano de campanha eleitoral costuma ser agitado na Vila Velha III, onde mora a comerciante Joane Matos, de 34 anos. Ela conta que o bairro é parada obrigatória para políticos em campanha na Capital. No entanto, apesar das inúmeras promessas, sorrisos, panfletos, picolés e bonés distribuídos, a maioria das ruas continua sem iluminação pública ou saneamento básico.

“Não tem iluminação pública na rua, mas no papel vem a conta que é uma beleza. E não é barata. Engraçado que eu tenho que pagar a taxa, mas não tem o serviço”, desabafa. A mulher já não se preocupa com voto, não decora partido de ninguém. Ela teima em acreditar que a próxima eleição pode ser aquela que vai mudar tudo. 

Foram muitas decepções ao longo dos 15 anos em que mora na Vila Velha. Não houve vereador ou prefeito que fizesse alguma diferença para ela ou os vizinhos. O mundo lá fora evoluiu e Joane ainda usa o balde para lavar louça com água esverdeada e cheia de mosquitos da caçamba.

O esgoto vai todo para o mangue nos fundos da casa, onde crianças jogam futebol no fim da tarde, em meio aos dejetos. Não há pracinha ou parque por ali. A diversão é aquele campo de lama improvisado.

“Se alguém vier para ajudar nós aqui, pra valer, vamos ajudar, votar também. A gente quer ajudar quem faz algo por nós aqui. Vai ser bem recebido quem quiser ajudar de verdade”, explica. Ela costuma atuar na campanha de um e de outro em troca de um salário mínimo. Levanta a bandeira, arranja gente para trabalhar e eleger o candidato da vez.

Mas, toda vez, o sentimento depois da apuração das urnas é o mesmo da eleição anterior. Ela conta que se sente traída. Os que a abraçavam com força, desaparecem. “Se passar aqui é capaz de não saber quem eu sou”, reflete. 

Em 2016, ela já decidiu: vai se animar com o que há de concreto e deixar as promessas de lado. Com o dinheiro do trabalho extra, dá para comprar uma coisa ou outra, mas continuar acreditando em juras vazias só causa chateação.

Depósito

Coleta de lixo é raro na região, segundo os moradores, por isso, eles jogam o que não querem mais no mangue. Ao lado da sujeira, funciona uma escola. As crianças se animam com o começo das campanhas. Ainda lembram com alegria do sorvete que o candidato pagou para eles, do momento de decorar os jingles e distribuir panfletos sabe-se lá com o que escrito. Era emocionante. Mas o que fazem os políticos, afinal?

“Eu sei a resposta! Eles distribuem papel!”, diz uma menina de 12 anos. O colega completa a resposta: “Não é só isso, também querem brigar pelos direitos”, afirma convicto. O garoto mal pode esperar para ouvir os novos planos para o bairro. Na idade dele, o sonho está só começando.

Já para o vendedor Agenor Jerônimo, de 50 anos, há pouco que o faça acreditar que algo de bom virá. Ele diz que enquanto os políticos brigam pelo poder em Brasília, o povo aguarda, abandonado. “Às vezes, tem um bem intencionado. Mas logo vê que uma andorinha só não faz verão. Quando vê que os outros não deixam fazer, esmorece. Não vê?”, avalia.

Ele mora ao lado da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Vila Velha. Agenor diz que o prédio é bonito, mas nunca abriu. Condicionares de ar novinhos, mas nenhum funcionário para atender a população. “Acredito que, com certeza, devem inaugurar a unidade agora nessa época de eleição”, diz.

Conforme publicado no O POVO, em outubro último, segundo o coordenador dos hospitais e unidades especializadas de Fortaleza, Francisco Alencar, não há previsão para que a UPA seja aberta. A unidade aguarda o processo de habilitação do Ministério da Saúde. “Estamos tão interessados quanto a comunidade que a UPA funcione o mais rápido possível”, afirma.